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OUTROS OLHOS
Para magistrado, doença não anula a aplicação da lei; ministro do STF diz que prisão é "socialmente inaceitável"
Juiz diz que cumpriu a lei ao manter prisão
DA REPORTAGEM LOCAL
O juiz de primeira instância José Guilherme Di Rienzo Marrey,
da 6ª Vara Criminal de Campinas,
no interior paulista, afirma que
apenas cumpriu a lei de crimes
hediondos ao negar os pedidos de
liberdade à ex-bóia-fria Iolanda
Figueiral, 79. Para o ministro do
STF Marco Aurélio de Mello, porém, a interpretação da lei é um
"ato de vontade" e a prisão de Iolanda é "socialmente inaceitável".
Marrey diz não ter opinião sobre a lei, que se tornou alvo de
uma campanha de protesto da
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil) e de institutos de criminologia. "Enquanto a lei estiver em
vigor, eu tenho de aplicá-la", afirmou o juiz, que menciona o fato
de o Tribunal de Justiça de São
Paulo também ter negado o pedido de liberdade de Iolanda.
O juiz sustenta que o crime de
tráfico de drogas é grave e doenças não podem anular a aplicação
da legislação. "A situação pode ser
grave, o que a gente lamenta, mas
não justifica a soltura", diz o juiz.
Marrey sustenta ainda que Iolanda está recebendo tratamento
médico adequado.
A família de Iolanda afirma que
ela sente muitas dores e interrompeu o tratamento feito em um
hospital próximo de sua casa.
Funcionários da Penitenciária Feminina do Tatuapé admitem que
a enfermaria não é o local adequado para abrigar um caso dessa
gravidade. Antes de ser transferida para a penitenciária, Iolanda
estava na cadeia de Valinhos, na
região de Campinas. Segundo ela,
dormia no chão.
O tráfico de drogas é, dos crimes
hediondos ou equiparados, o responsável pelo maior número de
pessoas presas. Censo penitenciário de São Paulo mostrou que 19%
dos detentos cometeram esse tipo
de crime. O percentual de presos
por homicídio não supera 13%.
É entre as mulheres que o tráfico tem maior representatividade.
Entre as presas, 43,8% foram acusadas por esse crime -principal
causa de prisão. Entre os homens,
o líder é o roubo, com 65%.
Para o ministro Marco Aurélio,
a interpretação da lei pode ser flexível. "Não dá para colocar carimbo com a lei como se todas as situações fossem iguais. As leis foram feitas para os homens e não
os homens para as leis. O caráter
humanitário não pode ser colocado de lado", afirma.
Marco Aurélio defende que a
prisão tem de ser aplicada como
uma exceção. "Qual a ameaça que
essa presa com câncer terminal
representa? Manter a prisão é socialmente inaceitável", diz.
Para ele, a prisão provisória (antes da condenação) -como a de
Iolanda- tem de ser ainda mais
criteriosa, porque envolve pessoas que, até o julgamento, são
consideradas inocentes. "O chicote pode mudar de lado. Amanhã,
nós ou nossos familiares podem
ser acusados, e aí vamos querer o
pleno direito de defesa."
Está marcado para o dia 15 de
dezembro a votação no pleno do
STF que pode decidir o futuro da
lei. Deve ser analisada a constitucionalidade da lei em relação ao
veto à progressão de regime. Dos
11 ministros, quatro votaram pela
mudança -entre eles, Marco Aurélio, que é o relator- e dois foram favoráveis à manutenção.
Presidente da comissão de estudos do conselho federal da OAB
que discutiu mudanças na lei, o
advogado Alberto Toron defendeu, em seu relatório em outubro
de 2004, que seja banida a proibição da concessão da liberdade
provisória, entre outras alterações. "O juiz fica com as mãos atadas, impossibilidade de verificar a
necessidade da prisão", diz.
(GILMAR PENTEADO)
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