São Paulo, segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

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MOACYR SCLIAR
Correndo contra o tempo


Uma reunião que, em cinco minutos, obtivesse um consenso sobre o completo desarmamento atômico



Cientistas adiantam em dois minutos o "Relógio do Apocalipse". O ponteiro do "Relógio do Apocalipse", criado em 1947 para simbolizar os riscos das armas nucleares para a humanidade, agora marca cinco para a meia-noite, após ser adiantado em dois minutos, durante cerimônias organizadas simultaneamente em Washington e em Londres. "Estamos no limiar de uma segunda era nuclear. O mundo não se confronta com opções tão perigosas desde que as primeiras bombas atômicas foram lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki [1945]", alertou o grupo de cientistas, que inclui 18 prêmios Nobel.
"O recente teste norte-coreano de uma arma nuclear, as ambições nucleares iranianas, as insistentes evocações da presença contínua de 26 mil armas nucleares nos Estados Unidos e na Rússia são sintomáticos da incapacidade de resolver os problemas trazidos pela tecnologia mais destrutiva da Terra", afirmou. Esta é a primeira vez que o relógio é adiantado desde fevereiro de 2002. O relógio foi criado por cientistas de Chicago que participaram do projeto Manhattan, do qual se originou a bomba atômica. Folha Online


O anúncio de que o "Relógio do Apocalipse" havia sido adiantado, chamando a atenção da opinião pública para o risco de um conflito atômico, teve muita repercussão e aparentemente cumpriu seu papel de advertência simbólica. Mas alguns dos cientistas participantes do grupo que criou o "Relógio" não se mostraram inteiramente satisfeitos com os resultados. Como disse um deles: "Estamos sempre advertindo, sempre alarmando, mas isso não basta: precisamos indicar um caminho para o desarmamento".
Como fazê-lo? Seguramente as discussões para isso se estenderiam por anos, décadas talvez; chegar a um consenso neste controverso e, literalmente, explosivo assunto seria muito difícil. Mas aí um dos cientistas teve uma idéia revolucionária. "E se, de fato, tivéssemos só cinco minutos para chegar a uma proposta conciliatória?", perguntou ele.
"Se os chefes de Estado tivessem nos advertido que em cinco minutos começariam a guerra atômica a menos que apresentássemos uma solução para o problema? Será que em cinco minutos não chegaríamos a esta solução?"
Resolveram fazer uma espécie de simulação. Uma reunião que, em cinco minutos, não mais do que cinco minutos, obtivesse um consenso sobre o completo desarmamento atômico.
Faltando cinco minutos para a meia-noite, começaram. No primeiro minuto, foram listados os problemas que impediam um acordo nuclear global. No segundo minuto foram apresentadas as alternativas de solução. No terceiro minuto foram enumerados os argumentos pró e contra cada uma das alternativas. No quarto minuto a proposta foi posta em votação, e aprovada. No quinto minuto o acordo foi assinado, e todos respiraram aliviados: a catástrofe havia sido evitada.
Já estavam todos se congratulando, quando alguém bateu à porta. Era um funcionário, com uma mensagem. O presidente do Irã acabara de anunciar que havia construído a sua primeira central nuclear.


MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha


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