São Paulo, domingo, 29 de fevereiro de 2004

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SAÚDE

Médicos recomendam a cirurgia para prevenir doença que infecciona o órgão, como a que vitimou o vice-presidente

Vesícula é extraída mesmo sem sintoma

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Ela é um órgão pouco lembrado, mas, quando se manifesta, é logo eliminada. Trata-se da vesícula biliar, cuja principal função é coletar e armazenar a bile, líquido produzido pelo fígado que participa do processo digestivo.
A vesícula se torna um problema quando são formados cálculos (pedras de colesterol ou de pigmentos biliares) no seu interior. Nessa condição, mesmo que não haja sintomas, os médicos indicam a retirada do órgão.
Os cálculos podem bloquear o canal de saída do órgão, impedindo o fluxo natural da bile. Retido, esse líquido desencadeia uma infecção (colecistite aguda). Foi essa doença que acometeu o vice-presidente José Alencar (PL), internado às pressas no hospital Sírio Libanês, no último sábado, para a retirada da vesícula.
Se não for tratada a tempo, a colecistite pode romper para dentro do abdômen, provocando uma peritonite aguda (infecção das membranas que revestem as camadas abdominal e pélvica).
Para não correr o risco de ter o problema agravado, os médicos recomendam atenção aos sinais que o órgão possa dar ao longo da vida. Os mais comuns são alterações na digestão, que tende a se tornar mais lenta, e dores agudas, como cólica na parte superior de abdômen.
Segundo o cirurgião gastroenterologista Raul Cutait, médico que operou o vice-presidente, às vezes os sintomas não são claros e podem ser confundidos com problemas de estômago ou de fígado.
Como os órgãos são vizinhos, explica o médico, os sintomas podem se sobrepor. Por isso, na investigação, os médicos costumam pedir, além da endoscopia (exame que faz uma inspeção visual do aparelho digestivo), um ultra-som para avaliar a vesícula.
O caso da síndica Maria Lilia Antunes de Almeida, 70, ilustra bem essa confusão de diagnóstico. Ela diz ter sofrido durante dois anos com os cálculos e ter realizado inutilmente duas endoscopias e uma colonoscopia (exame endoscópico da superfície interna do cólon). "Após tanta procura, as pedras foram achadas pelo meio mais fácil [um ultra-som]."
Ela diz que sofria dores abdominais horríveis, que pareciam irradiar-se também para a coluna vertebral. "Era um horror. Não me sentia confortável em nenhuma posição", conta. Na cirurgia, foram retiradas três pedras. "Pareciam bolinhas de gude", brinca.
De acordo com Marcelo Ribeiro, cirurgião do aparelho digestivo do Hospital São Luiz, muitas pessoas descobrem os cálculos "por acaso". "Geralmente vão fazer um ultra-som de um outro órgão e são surpreendidas pelo achado das pedras", diz. Estudos internacionais indicam que cerca de 75% das pessoas com pedras na vesícula não têm sintomas.
Na opinião de cirurgiões gastroenterologistas, o melhor tratamento para pedra na vesícula é a retirada do órgão. Entre os clínicos, há controvérsias. "Nem todo mundo encaminha para cirurgia os casos assintomáticos. É preciso avaliar cada caso", afirma o gastroenterologista Jaime Natan Eisig, do Hospital das Clínicas.
De acordo com Marcelo Ribeiro, há um consenso entre os cirurgiões de que é muito mais seguro para o paciente retirar a vesícula ainda que não haja sintomas dos cálculos. "Como não podemos prever quais casos vão permanecer assintomáticos e quais vão se complicar, o melhor é a cirurgia."
Segundo o médico José Eduardo Monteiro da Cunha, chefe do serviço das vias biliares do Hospital das Clínicas, 80% dos casos de câncer de vesícula, altamente maligno, estão relacionados à presença de cálculos no órgão.
A doença também pode permanecer assintomática por muito tempo. "Quando os sintomas aparecem, geralmente o câncer já está instalado e a possibilidade de cura é mínima", afirma o médico.



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