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WALTER CENEVIVA
Lógica eleitoral em falta
É um erro grave supor que a manifestação dos juízes eleitorais seja um excesso ou uma intromissão indevida
A ERA DAS COMUNICAÇÕES, ampliada pela televisão e globalizada pela internet, provocou
um efeito contrário ao que seria de
esperar. Em lugar de impor, aos administradores públicos, a preocupação com a contínua unidade lógica
de suas manifestações, deixou-os livres para todas as incongruências,
contribuindo para que o direito pereça na praia das contradições.
Tomo o exemplo dos que proclamam o sacrossanto dever do juiz de
só se manifestar nos autos. Ao lado
dessas posições, há os que se queixam da posição dos magistrados que
se comportam como seres extraterrenos, fortes no processo, mas
alheios às angústias dos que clamam
por justiça.
Recentemente o presidente da
República, ao criticar manifestações
do ministro Marco Aurélio Mello,
presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), queria que este "não
desse palpites" em assuntos estranhos à função judicial. Ficando apenas na órbita do direito constitucional, constata-se que o chefe do Executivo federal não se recorda de antigas manifestações (do tempo em
que era oposição), nas quais se queixava do oposto, reclamando da Justiça Eleitoral atenção contra providências ou atos que prejudicavam
interesses políticos de seu partido.
Breve exame dos fatos, depois da
retomada democrática, mostra que
Luiz Inácio Lula da Silva não tem razão, tanto na história, quanto no direito constitucional. A Constituição
atribui à Justiça Eleitoral, com primazia para o TSE, competências
que transcendem da simples função
de julgar, como resulta da possibilidade legal de expedir instruções para as eleições, norteando o processo
eletivo, ajustado às transformações
pelas quais este tem passado.
Outra mostra da diferença de tratamento está na irrecorribilidade
das decisões proferidas pelo TSE,
salvo apenas as que contrariarem a
Constituição e as que denegarem
habeas corpus ou mandados de segurança (artigo 121 da Carta Magna,
no parágrafo 1º). Mesmo decisões
dos TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) têm limites de recorribilidade de suas decisões, compreensível
quando se pensa na urgência da
apreciação definitiva para problemas surgidos no curso dos pleitos.
Em face da situação especial dos
procedimentos eleitorais, os presidentes do TSE e dos TREs são presenças freqüentes nos meios de comunicação. Acabam integrados à
permanente necessidade de esclarecerem a nação sobre problemas jurídicos relevantíssimos, de cuja defesa
são os principais encarregados pela
lei brasileira. É um erro grave, mostrando descuido no trato constitucional, supor que a manifestação dos
juízes eleitorais, na órbita de sua
competência (nacional, estadual ou
municipal), seja um excesso ou intromissão indevida em questões que
não lhes digam respeito.
No campo da política (que é, necessariamente, o cerne jurídico das
cortes eleitorais), cada pronunciamento se presta a toda sorte de inferências, justas ou injustas, agradando ou desagradando os poderosos da
hora. É muito possível que o presidente Lula, cuja história de vida é
um bom exemplo das vantagens da
democracia, trate de voltar sobre
seus passos quando, terminado seu
atual período de governo, retorne à
arena política sem as vantagens da
presidência. Cairá na real.
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