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JUVENTUDE ENCARCERADA
Cleonder Santos Evangelista afirma que se sentiu abandonado e que "foi usado mais do que usou"
Não me ajudaram o bastante, diz ex-interno
DA REPORTAGEM LOCAL
O ex-interno da Febem Cleonder Santos Evangelista, 20, afirma
que é vítima dos personagens de
seu próprio livro. Em uma história verídica, preferiu citar os nomes verdadeiros. Estaria, por isso,
sendo perseguido.
Mesmo assim, afirma não estar
arrependido de ter feito o livro,
mas diz que se sente usado e
abandonado. "Eles não me ajudaram para que eu conseguisse a
minha independência."
Folha - Quando você soube que
era suspeito de matar um garoto
de 16 anos?
Cleonder Santos Evangelista -
Após a entrevista que eu dei no
[programa] Jô Soares, em junho
ou julho do ano passado. Coloquei o pé na cidade [Borborema]
e fui chamado na delegacia.
Folha - Por que você faz essa relação?
Evangelista - Perguntei ao delegado se não tinha sido chamado
por uma questão pessoal. Pelo fato de ter citado o nome dele em
rede nacional.
Folha - O que você falou na entrevista?
Evangelista - Aos 14 anos, eu
pratiquei um assalto em um mercado próximo à casa do delegado.
Na fuga, a mulher dele estava em
frente à casa e saiu correndo [no
livro, Evangelista relata que gritou
que ela iria morrer se chamasse a
polícia].
Folha - O livro depreciava o delegado?
Evangelista - Eu acho que o colocava em uma situação não muito
bem vista. Mas só contei a verdade, que ele me agrediu quando fui
preso, e eu não resisti à prisão.
Uma série de abusos.
Folha - E a pessoa que o acusou de
matar o garoto, você conhecia?
Evangelista - Conheci só depois
que ele começou a me acusar. Ele,
às vezes, andava com o Pedrinho
[acusado de atirar contra Evangelista em fevereiro por supostamente não gostar de ter sido citado]. Não sei se é pessoal, se é por
parte da autoridade, se é por parte
do grupo do Pedrinho. Nesse assalto, ele fugiu e me deixou sozinho. Pelo fato de ter narrado isso
no livro, ele ficou injuriado.
Folha - O delegado leu o livro?
Evangelista - Não sei. Mas pela
emissora de televisão, muitos ficaram sabendo.
Folha - E isso, a seu ver, influenciou a investigação?
Evangelista - Essa investigação é
um mal-entendido, uma investigação tapa-buraco.
Folha - Com qual intenção?
Evangelista - De me desmoralizar. De acabar com isso que eu estou construindo. Esse livro só me
trouxe problema.
Folha - Você está arrependido de
ter feito o livro?
Evangelista - Não. Eu me sinto
triste. Porque não estou mais ajudando a ressocializar esses jovens.
Folha - A editora disse que cancelou as palestras que promovia porque você estava passando por uma
recaída no uso de drogas e que teria lhe orientado a fazer um tratamento, mas você optou por voltar
para Borborema.
Evangelista - Foi mais ou menos
isso. Depois de um tempo, eu tive
uma recaída. Procurei um psicólogo e fiquei tranqüilo.
Folha - Recaída em relação ao uso
de drogas?
Evangelista - Minha recaída foi
mais ficar deprimido. Não voltei a
usar droga. Mas voltei para Borborema.
Folha - E como o livro repercutiu
na cidade?
Evangelista -Alguns pessoas leram, muitas viram pela televisão.
A única coisa que eu podia detectar era um pouco de inveja.
Folha - Quem tinha inveja?
Evangelista - A sociedade, as
pessoas que me conheciam. Elas
receberam muito mal. Não gostaram de ter os nomes citados, como se eu tivesse que pedir.
Folha - Você foi usado como
exemplo de recuperação pela Febem. Agora, você se sente abandonado?
Evangelista - Me sentia dependente. Eles não me ajudaram o suficiente para que eu conseguisse a
minha independência.
Folha - Como assim?
Evangelista - Muitas vezes eu pedi emprego fixo porque estava
com a mulher grávida.
Folha - A editora diz que lhe deu
emprego e que você abandonou.
Evangelista - Isso foi antes. Depois que eu lancei o livro, precisei
trabalhar em cima dele, para divulgar. Depois o livro deu uma
baixada, foi nesse momento que
eu precisei disso.
Folha - Você se sente abandonado?
Evangelista - Um pouco. A melhor explicação é: usei o que eles
me ofereceram e eles me usaram.
Só que fui mais usado do que usei.
Folha - Se passasse por isso de novo, o que você mudaria?
Evangelista - Quase tudo. Parei a
faculdade para divulgar o livro e
não ganhei quase nada.
Folha - Você faria de novo o papel
do menino de ouro?
Evangelista - Por que não? Eu
apenas quis mostrar que as pessoas que erraram também conseguem produzir frutos bons.
Folha - Em que momento você ficou mais deslumbrado com tudo?
Evangelista - Foi depois da Bienal [de São Paulo, em 2004]. Lá
conheci o presidente [Lula], o governador [Geraldo Alckmin].
Folha - Você pretendia fazer um
segundo livro?
Evangelista - Já tenho algumas
páginas escritas. É a continuação.
Eu já tenho o título.
Folha - E qual é?
Evangelista - Um forasteiro na
sociedade. É a continuação. A vida continua.
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