São Paulo, sexta-feira, 29 de maio de 2009

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BARBARA GANCIA

Monumento ao priapismo


Que se termine a obra de uma vez por todas e que aquele trecho da rua Tucumã volte à sua rotina normal

É IMPOSSÍVEL não identificá-lo de relance da janela do avião, na rota de aterrissagem de Congonhas. Ninguém que trafegue pela marginal Pinheiros de dia ou de noite ou mesmo sob intenso temporal poderá confundi-lo com outra edificação: ele fica lá como se fosse um monumento ao priapismo.
E mesmo quem já viu de tudo na vida em matéria de prédio desgraçado de feio e de exagerado dirá que o monstrengo da rua Tucumã, no Jardim Paulista, na zona oeste de São Paulo, é um espigão extraordinário.
O paulistano está cansado de saber que aquele é um prédio em que mora um problema. Há mais de 15 anos, por exceder de maneira quase pornográfica os gabaritos estabelecidos, a obra foi embargada. Desde então, o edifício Villa Europa virou símbolo de excesso numa cidade acostumada aos recordes negativos.
Agora, a Justiça impôs uma nova derrota aos 15 moradores dos apartamentos avaliados em R$ 7 milhões (em média) cada um. Quando finalmente seus incorporadores achavam que o prédio seria inaugurado, veio um juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública e manteve a ordem de demolição da lateral dos cinco andares superiores, expedida em 2004 -o que deve atrasar mais uma vez a inauguração prevista para julho.
Antes mesmo de o ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira mandar buscar o célebre arquiteto Frank Marino nos EUA para construir sua casa-museu nas imediações da outra margem do rio Pinheiros, o edifício Villa Europa já era visto pela população como tudo o que pode acontecer de errado quando muito dinheiro encontra o mau gosto.
O prédio foi um dos primeiros da cidade a copiar o que é uma reinterpretação da reinterpretação do neoclássico que agora predomina entre os lançamentos de luxo onde se abrigaram os ricos que se sentem inseguros morando em casas.
Fico pensando o que um francês recém-chegado de Paris não deve achar ao ver essa profusão de prédios com cúpulas de ardósia, essas casas de grã-finos em que predomina o estilo império (napoleônico), esses nomes pomposos de prédios, tais como Place des Vosges, Villa D"Este e até um tal de Buckingham Palace que há na rua Dr. Melo Alves.
Será que o francês se sente homenageado? Será que ele não acharia mais autêntico ver prédios em São Paulo com nomes como Anhanguera, Uirapuru, Tabatinga, Arara Azul, Pirapora e por aí vai?
Mas, voltando ao Villa com dois "l" Europa da rua Tucumã, trata-se de um empreendimento que começou com uma maracutaia: alguém propôs que se construísse uma obra fora do padrão. A incorporação foi sendo executada e houve então uma segunda maracutaia, que foi a aprovação da obra pela prefeitura. Na terceira etapa, os compradores podem ou não ter sido enganados. Se foram, lamento pelo que tiveram de passar até aqui.
Mas, ainda assim, todos eles continuam a ser imputáveis pela arrogância de impor essa espécie de estátua do Borba Gato em forma de edifício à cidade; por achar que seus metros a mais não iriam incomodar; pelo mau gosto, mau gosto, mau gosto e por continuar por tanto tempo usando o jeitinho tapuia para tentar consertar o que estava errado.
Ora, que se diminua a lateral dos cinco andares mais altos, que se termine a obra de uma vez por todas e que aquele trecho da rua volte à sua rotina normal o quanto antes. Os vizinhos irão agradecer. Ufa!

barbara@uol.com.br

www.barbaragancia.com.br


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