São Paulo, sexta, 29 de agosto de 1997.



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LEI POLÊMICA
Médicos e "curiosas" cobram por operações clandestinas que colocam em risco a vida das mulheres
Aborto em SP custa de R$ 150 a R$ 2.000

MALU GASPAR
da Reportagem Local

Fazer um aborto clandestino em São Paulo pode custar de R$ 150 a R$ 2.000, segundo levantamento feito pela Folha em locais que fazem aborto e com mulheres que abortaram recentemente.
As formas de interromper a gravidez vão desde a ingestão de chás ou comprimidos abortivos -de venda proibida sem receita médica- até cirurgias em clínicas bem equipadas. Há ainda casos das chamadas "curiosas", que introduzem objetos no útero para provocar uma hemorragia nas gestantes (veja quadro ao lado).
Em todos os casos, os métodos escolhidos dependem da condição financeira de quem aborta. Os de maior risco para a saúde da mulher são mais baratos.
Segundo o ginecologista Jorge Andalaft Neto, do programa de aborto legal do Hospital do Jabaquara, a sequela mais perigosa de um aborto é a infecção uterina. "Em casos extremos, a infecção se espalha e pode até matar", diz.
A maioria dos abortos feitos em clínicas clandestinas sem condições acaba nos hospitais públicos. Acaba sendo necessária a cirurgia de curetagem em hospitais para completar o aborto e conter uma infecção no útero.
Dados do Ministério da Saúde mostram que, em 96, foram realizadas 246 mil curetagens pós-aborto em hospitais do SUS (Sistema Único de Saúde). Dessas, 51,6% em mulheres com até 24 anos.
Esse número nem de longe representa o total de abortos realizados no Brasil -eles não incluem mulheres que mesmo com complicações não procuram o hospital, que vão a hospitais particulares ou que não sofrem complicações.
Uma organização americana, o Instituto Allan Gutchmacher, estimou em 1,4 milhão os abortos realizados no Brasil. Não há estimativas oficiais.
Nas clínicas, os preços podem variar de R$ 500 a R$ 2.000, de acordo com as condições de higiene, equipamentos e renda das pacientes.
O preço médio do aborto nas clínicas visitadas pela Folha é R$ 1.000. Os médicos fazem a consulta, que custa de R$ 30 a R$ 100, e, depois de conversar com a paciente -nem sempre é pedido exame de gravidez-, marcam dia e combinam preço. O pagamento é sempre em dinheiro e à vista.
"Esses fatos mostram que a ilegalidade do aborto só aumenta a mortalidade materna, principalmente em mulheres pobres. Isso é que é um desrespeito ao direito de saúde da mulher", afirma Marlene Libardoni, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria.
Para o ginecologista Thomaz Gollop, o aborto deve ser considerado um problema de saúde pública. "É preciso olhar para a questão como um problema real e encontrar soluções para ele. Para mim, essas soluções não passam pela punição", diz.



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