São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 2008

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análise

Governo Lula se dobra a lobby da indústria

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo Lula sucumbiu ao lobby da indústria do cigarro. O principal indício da cooptação está na Casa Civil: um projeto de lei proibindo o fumo em ambientes fechados chegou lá na primeira semana de fevereiro deste ano, com a previsão de que iria para o Congresso em três, quatro semanas. Sete meses depois, o projeto continua na Casa Civil, sem nenhuma perspectiva de ser votado.
O problema não é de ordem técnica, segundo Paula Johns, diretora da ACT (Aliança do Controle do Tabagismo), rede que reúne mais de 400 ONGs brasileiras que atuam contra o cigarro. Segundo ela, o Ministério da Saúde, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e o Inca (Instituto Nacional de Câncer) incluíram no projeto questões que já são consensuais na área da saúde. "Empacou na questão política", diz Johns.
Uma das maiores especialistas em controle de tabaco no mundo, a brasileira Vera Luiza Costa e Silva, que dirigiu o setor na OMS (Organização Mundial da Saúde), foi a primeira a apontar a incongruência de um governo que se posiciona internacionalmente como vanguarda no combate ao fumo e internamente se dobra à indústria.
O caso mais estridente foi a suspensão da lei que proibiu a publicidade para que os carros de F-1 patrocinados pela Philip Morris pudessem disputar o Grande Prêmio de São Paulo em 2003. A lei foi suspensa por uma medida provisória assinada pelo presidente Lula, a pedido da então prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT). O dirigente mundial da F-1, o britânico Bernie Ecclestone, fez o melhor comentário sobre a medida provisória feita sob medida para a Philip Morris: "This is Brazil".
Pode parecer piada, mas o assunto é gravíssimo. Cigarro é a maior causa de morte evitável, segundo a OMS. Os mortos pelo tabagismo ultrapassam os 200 mil ao ano -só para comparar, as vítimas de homicídio não chegam a 45 mil.
Uma das piadas que corre no Planalto sobre a paralisia do projeto de lei nos escaninhos da Casa Civil é que o próprio presidente Lula teria dito que não gostaria de deixar de fumar cigarrilha no seu gabinete. Se a lei for aprovada, Lula terá de ir para um ambiente aberto para dar as suas pitadas.
Se fosse só isso, seria cômico. O problema é que Lula é amigo de um dirigente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), entidade usada pela indústria do cigarro para fazer lobby, atividade fartamente documentada nos arquivos americanos.
O governo deu R$ 300 mil a um evento da Abrasel. O TCU (Tribunal de Contas da União) considerou o repasse lesivo aos interesses públicos. Em 2006, Lula marcou presença no congresso de bares e restaurantes.
O presidente parece que já fez a sua escolha ao ser colocado diante do dilema que separa a saúde e o lobby do cigarro.


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