São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 2008

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BARBARA GANCIA

Roberto e Caetano, impecáveis


No dia seguinte, quando fui ler os jornais, dei de cara com dois textos espinafrando o show no Ibirapuera

EU NÃO IA, NÃO fazia questão e, aliás, já tinha até matutado aproveitar a ocasião para dar mais uma desancada no rei, no meu site/blog, por conta daquela história escandalosa da biografia que ele censurou sem nem ao menos ler. Mas, na última hora, um amigo me convidou e eu, meio por dever de ofício, meio para honrar o privilégio concedido pelo amigo, acabei aceitando e indo ao Auditório Ibirapuera ver Roberto Carlos e Caetano Veloso cantando Jobim, no show em homenagem à bossa nova. A noite saiu melhor do que a encomenda. Músicos de primeira qualidade, cenário corretíssimo, organização bombando, toda a bela (e "brutta") gente de São Paulo comovidíssima na platéia, dois grandes ídolos no palco, enfim, acabei tendo de confessar, na minha coluna da Bandnews FM, que eu deveria pagar a língua, uma vez que o espetáculo tinha sido memorável. Pois qual não foi minha surpresa, no dia seguinte, quando fui ler os jornais e dei de cara com dois textos espinafrando o show. Peraí: será que estávamos no mesmo local? Abro aqui um parêntese para dizer que respeito os colegas que assinaram os textos em questão. Jotabê Medeiros ("O Estado de S. Paulo") e Sylvia Colombo, desta Folha, são o que há de melhor no jornalismo cultural tapuia. Além do que, conheço ambos e gosto deles. Tanto gosto, que sinto-me à vontade para discordar de tudo o que eles disseram. Vamos lá: Jotabê chamou o show de "naftalínico", disse que "o concerto cedeu à nostalgia". Ué, mas não era isso mesmo que o pessoal queria ver? Ou será que Roberto e Caetano deveriam ter apresentado roupagens inteiramente novas e exóticas para músicas incrustadas em nossa medula espinhal? Você pega dois artistas de uma certa idade, de estilos solidificados e glorificados, os coloca para cantar um repertório "clássico" e quer que eles promovam a queda da Bastilha? Para quê, Jotabê? Na minha modestíssima opinião, um dos aspectos mais sedutores do show foi justamente sua simplicidade. Jotabê, que sabe tudo de música, implicou de tal forma com o espetáculo que no seu texto sobrou até para o neto do homenageado: "O pianista Daniel Jobim usava chapéu característico do avô, como que para reiterar a onipresença do compositor. Um gesto dispensável, já que o próprio repertório tinha essa função". Pois eu achei o panamá do Daniel um charme. E charme tem tudo a ver com bossa nova, tem não, JB? A única coisa de que não posso discordar é quando ele diz que o Caetano deu "sambadinhas à Rubens Barrichello". Bom humor é sempre a salvação da pátria. Sylvia Colombo, por sua vez, já chuta o balde na entrada. Começa dizendo que as celebridades estavam "loucas para aparecer" e que os fotógrafos emperravam a passagem. Sim, e daí, o que há de novo no front? Se em um evento dessa natureza a turma não estiver excitada, e se só um ou dois fotógrafos derem as caras, não terá sido um fracasso retumbante? As mesmíssimas duas coisas também podem ser ditas, digamos, da noite do Oscar. Sylvia fala ainda em desrespeito ao público. Ora, o que se viu ali não foi um evento normal com ingressos vendidos em bilheteria. A maioria dos bacanas que ali estava foi a convite do banco que patrocinou a brincadeira. Se era para ficar tiririca, que fosse com isso. E não com os dois artistas, que estiveram impecáveis.

barbara@uol.com.br
www.barbaragancia.com.br



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