São Paulo, domingo, 29 de outubro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PUC acaba com déficit após seis anos

Depois de demissões e mudanças administrativas, universidade operou "no azul" durante todo o ano, o que não ocorria desde 2000

Instituição perdeu 30% dos docentes e reduziu pesquisa; professores reclamam de acúmulo de aulas e alunos desconfiam de medidas

FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL

Após a demissão de 30% dos professores, mudanças administrativas e uma interferência da Igreja Católica, a PUC-SP começou a sair do sufoco financeiro: em todos os meses deste ano, a universidade conseguiu operar sem déficit, fato que não ocorria desde 2000.
A previsão da universidade é que a situação positiva se mantenha, mesmo com o pagamento do 13º salário e das parcelas da dívida bancária, que totaliza R$ 104,7 milhões. As prestações começaram a ser quitadas neste mês.
O promotor de fundações do Ministério Público Airton Grazzioli, que fez uma auditoria na PUC e continua acompanhando as contas da universidade, projeta até mesmo um superávit de R$ 3,9 milhões ao final deste ano. "As medidas foram amargas, mas trouxeram resultados positivos", disse.
A instituição só não fechará 2006 "no azul" caso haja atraso no repasse de recursos públicos para pagar a prestação de serviços na área de saúde, feita pela universidade. Nessa projeção mais pessimista, a reitoria estima um déficit para 2006 de R$ 818 mil. No ano passado, o valor foi de R$ 44 milhões e, em 2004, de R$ 30 milhões.
"Mesmo o pior cenário para este ano seria uma vitória. Chegamos a um equilíbrio financeiro sem descaracterizar a universidade", afirmou à Folha a reitora Maura Véras.

Histórico
Iniciada em 2001, com um pequeno déficit de R$ 4 milhões, a crise na PUC se intensificou em 2004, quando a diferença era equivalente a duas folhas de pagamento. Naquele momento, a universidade tomava empréstimos para pagar dívidas de curto prazo e chegou a dever para 14 bancos.
Os dois maiores causadores da dívida eram o volume de recursos utilizados para pagar salários (cerca de 90% de toda a receita) e o hospital Santa Lucinda, em Sorocaba (100 km de São Paulo), que teve déficits mensais de quase R$ 1 milhão.
Em 2005, no primeiro ano da gestão da reitora Véras, a dívida foi concentrada no Bradesco e no ABN Amro Real, que concederam empréstimo de R$ 82 milhões, com juros menores e cujas parcelas passaram a ser pagas só em outubro deste ano, dando um "fôlego" à PUC.
Mas uma das cláusulas do acordo era que a universidade teria de diminuir seu déficit, que estava na casa dos R$ 4 milhões ao mês. Em razão disso, a instituição começou a aplicar medidas para cortar gastos.
A mais drástica delas foi a demissão de 420 professores e 262 funcionários, o que equivalia a cerca de 30% do total. Para pagar as dívidas trabalhistas, a instituição tomou novo empréstimo, de R$ 25 milhões.
Os cortes ocorreram em duas fases. Na primeira, todas as unidades foram consultadas e indicaram os nomes a serem desligados. Como esse procedimento não foi suficiente, o cardeal dom Cláudio Hummes -que ocupa o principal cargo da mantenedora da PUC e é avalista da dívida- nomeou dois padres, que definiram a lista final de demissões.
Tradicionalmente, a Igreja Católica não interferia em assuntos na estrutura da escola.
Os desligamentos da segunda etapa foram considerados arbitrários pelo Conselho Universitário, órgão máximo da instituição, que tentou revertê-los. A posição da mantenedora, porém, prevaleceu.
As demissões fizeram com que as despesas com a folha salarial caíssem de 90% para 67% da receita da instituição.
Após os cortes, a média na PUC ficou em um professor para cada 11 estudantes, indicador semelhante às instituições estaduais paulistas (que inclui USP, Unesp e Unicamp), em que a média é de 9,2.
No hospital Santa Lucinda, além das demissões, houve mudanças administrativas, o que levou a entidade a "zerar" seu déficit no mês passado.

Pesquisa
Outra medida tomada foi a exigência de que os professores dedicassem mais tempo às aulas e menos às outras atividades, como a pesquisa.
A PUC possui um regime de trabalho em que parte da remuneração do professor é destinado para que ele faça atividades fora da aula, prática que difere das outras universidades privadas, onde o docente ganha por hora-aula dada.
A nova determinação, como gerou uma demanda menor por professores, ajudou no desligamento de alguns docentes.
Todas essas mudanças causaram sobrecarga nos professores, afirma o diretor da Apropuc (associação dos docentes), Erson de Oliveira. "Eu, por exemplo, tinha duas disciplinas. Agora, tenho quatro. Isso prejudica, porque você tem menos tempo para preparar as aulas, atender os alunos, corrigir provas", disse. "Mas também há pontos positivos. Agora recebemos os salários em dia." No auge da crise, o pagamento foi feito em até quatro vezes.
Já o presidente do centro acadêmico de direito, Esteban Saavedra Sandy, vê com desconfiança a decisão da universidade de aumentar o número de vagas em alguns cursos no próximo vestibular (em direito, subirá de 500 para 550). "Já não havia salas livres e o número de professores estava no limite. Preocupa como será a absorção dessas novas vagas."
A reitoria diz que nenhuma classe terá mais de 60 alunos e que os professores ficam, no máximo, metade do tempo na sala de aula, podendo utilizar o restante da carga horária para pesquisa e outras atividades.


Texto Anterior: Prefeito nega acordos com parlamentares
Próximo Texto: Instituição tem mais doutores que as fede rais
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.