|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OUTROS OLHOS
Políticos ligados aos direitos humanos dizem que paciente terminal não tem acompanhamento noturno em presídio
Comissão aponta atendimento falho a idosa
DA REPORTAGEM LOCAL
A ex-bóia-fria Iolanda Figueiral
está presa sem condições adequadas para o tratamento da doença,
segundo integrantes das comissões de direitos humanos da Assembléia Legislativa e da Câmara
Municipal de São Paulo.
Ontem à tarde, eles foram até a
enfermaria da Penitenciária Feminina do Tatuapé, na zona leste,
verificar a situação de Iolanda.
Segundo o deputado estadual
Ítalo Cardoso (PT), a presa, com
câncer de ovário e de intestino, recebe só analgésicos. "É óbvio que
ela não está no lugar adequado."
Cardoso afirma que a presa é
atendida por uma auxiliar de enfermagem durante o dia. Mas, à
noite, não teria nenhum funcionário na área de saúde para atendê-la no caso de uma emergência.
"À noite, ela fica ao deus-dará.
Não há ninguém para atendê-la."
Segundo informações conseguidas por Cardoso junto a funcionários, Iolanda não passou por
nenhum exame para saber a evolução da doença. "É quase como
você ter um câncer e receber só
aspirina. A situação é muito grave", afirma o deputado estadual.
Funcionários da penitenciária
também informaram à Folha que
a enfermaria não está preparada
para atender um caso de tamanha
gravidade.
A Folha procurou a Secretaria
da Administração Penitenciária,
mas a assessoria informou que o
secretário Nagashi Furukawa só
falará sobre o caso hoje.
Iolanda reclama de dores. Diz
que quer voltar para sua casa, em
Campinas, onde realizava tratamento em um hospital próximo.
O câncer em fase terminal -ela
foi submetido a uma cirurgia para
desobstrução intestinal três dias
depois de sua prisão e hoje usa
uma bolsa de colostomia- foi
usado pelo advogado dela para
tentar a sua liberdade provisória,
indulto ou até prisão albergue domiciliar (quando o acusado fica
em casa por problemas de saúde).
Todos os pedidos foram negados pela 6ª Vara Criminal de
Campinas e pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. O juiz de primeira instância José Guilherme
Di Rienzo afirmou que apenas
cumpriu a lei de crimes hediondos, em vigor desde 1990. A lei veta a concessão de indulto ou liberdade provisória e estabelece que a
pena deve ser cumprida integralmente em regime fechado
O advogado de Iolanda, Rodolpho Pettená Filho, disse que pretende ingressar com um habeas
corpus, com pedido de liminar
(decisão rápida e provisória), até
o final da semana. "Vou insistir
até a última instância. Não é justo
que uma mulher idosa, cuja acusação ainda nem foi provada,
morra no cárcere, longe dos filhos", disse. Iolanda tem quatro
filhos, 15 netos e 15 bisnetos.
Crítica à lei
Nos pedidos de liberdade feitos
à Justiça, Pettená Filho criticou a
Lei de Crimes Hediondos. Para
ele, a lei foi feita apenas para punir
os réus pobres.
"Pela lei de crimes hediondos,
pode-se ficar mais tempo na cadeia por tráfico de drogas do que
por um crime grave contra vida",
afirma o advogado Eduardo Reale
Jr., que faz parte do conselho da
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil) de São Paulo.
No caso de homicídio simples, o
réu pode receber progressão para
o semi-aberto depois de cumprir
um sexto da pena. No tráfico, tem
de cumpri-la integralmente em
regime fechado.
"Essa lei é a mais esdrúxula do
país. Até pela elasticidade que se
pode caracterizar alguém como
traficante", diz Reale Jr.
Para o juiz aposentado Alberto
Silva Franco, do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), a Lei de Crimes Hediondos
é a "maior excrescência" da legislação penal brasileira. Autor de
um livro sobre a lei, Franco afirma
que ela é inconstitucional porque
produz "distorções fantásticas".
"Essa lei provocou muitas distorções. Não há um razoável equilíbrio entre crime e pena. Por isso,
ela é inconstitucional."
Texto Anterior: Há 50 anos: General admite recorrer à censura Próximo Texto: Retratos do cárcere: Desativação de cadeias lota CDPs Índice
|