São Paulo, sexta, 30 de maio de 1997.



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SEM-TETO
Líderes estão criando associação com o nome dos companheiros mortos no confronto com a Polícia Militar
Ex-invasores contestam cadastramento

MARCELO OLIVEIRA
da Reportagem Local

Os ex-invasores do conjunto habitacional Juta 2, na Fazenda da Juta, em Sapopemba (zona leste de São Paulo), cuja desocupação pela PM, no último dia 20, gerou conflito que resultou na morte de três pessoas, estão criando uma associação própria.
Segundo os novos líderes, pessoas que não participaram da invasão estariam tentando se cadastrar no programa habitacional previsto para os ex-invasores.
O anúncio foi feito ontem, último dia dado pela CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo) para o cadastramento de ex-invasores.
Até as 13h de ontem, quando a fila de cadastramento já estava próxima do fim, 416 famílias haviam sido cadastradas.
A associação deve estar formada até 8 de junho. Na data está previsto um encontro entre os sem-teto e o secretário da Habitação, Dimas Ramalho, na Fazenda da Juta.
Segundo os ex-invasores, o secretário deve anunciar no evento a área que será destinada para o mutirão que a futura associação pretende manter.
A associação deverá ser batizada com uma sigla lembrando o nome dos três mortos no conflito: Crispim José da Silva, Jurandir da Silva e Geracir Reis de Moraes.
Aproveitadores
Um dos responsáveis pela criação do grupo, o operário desempregado Paulo Grego, 33, diz que muita gente tentou se aproveitar e se inscreveu, mesmo não tendo participado da invasão.
Grego diz que a futura associação entregou anteontem à Secretaria da Habitação uma lista própria com os nomes dos chefes de 454 famílias que estavam morando nos 448 apartamentos.
"Em cada prédio havia um ou dois responsáveis, que têm as listas completas, por bloco."
O número de famílias é maior que o de apartamentos, segundo Grego, porque houve casos de mais de uma família dividindo um só apartamento invadido.
O grupo pretende confrontar a própria lista com a da CDHU. "Quem não estava entre nós não participará da associação", afirmou Grego.
Segundo Grego, o movimento não tinha uma liderança própria. "Alguém foi procurar o Ademar (Luiz Machado, líder do Movimento dos Sem-Terra do ABC) para dar um apoio, já que ele tinha experiência em ocupações."
Além de Grego, formam o embrião do grupo Nelson Daniel da Silva, o Suplicy, cuja prisão gerou o confronto entre sem-teto e PMs, e Luiz Antônio Amêndola, cunhado de Crispim, morto no conflito.
"A gente sabia que seria difícil conseguir os apartamentos. O que a gente queria era poder negociar com o governo", disse Amendôla.
Segundo Grego, os ex-invasores não acreditavam em confronto.
"A gente pretendia resistir, sim, para fazer pressão. Ninguém imaginava que a PM iria atirar. O máximo que esperávamos era tomar umas 'cacetadas'."
CDHU
Roberto Arantes, do departamento social da CDHU, disse que a companhia só tomou conhecimento oficial da lista dos ex-invasores anteontem, quando o grupo esteve na Secretaria da Habitação.
Segundo Arantes, a CDHU confrontará os dados de seu cadastramento com a lista dos invasores.
Arantes lamentou o fato de as listas não terem surgido antes. "Se já tivéssemos a lista, o cadastramento já teria terminado."
Segundo Arantes, antes da reintegração de posse na Juta, a CDHU tentou, sem resposta positiva dos invasores, formar uma comissão com dois representantes de cada prédio.
Arantes afirma que a CDHU ainda não sabe qual destino terá o grupo cadastrado. "Precisamos terminar o perfil socioeconômico dessas pessoas para saber se elas vão querer participar de sorteio de apartamentos prontos ou de mutirão."



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