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Ação judicial revela lobby contra a merenda
Advogado pede indenização a um grupo de 11 empresários que, diz ele, o contratou para fazer denúncias contra terceirização do setor
Trabalho incluía coletar dados desabonadores das cidades atendidas pelo sistema e "buscar apoio político para reforçar denúncias"
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma ação na Justiça do Trabalho revela que um grupo de 11
empresários pagou um advogado para tentar impedir que prefeituras terceirizassem a merenda escolar.
Com a terceirização, essas
empresas, que vendem enlatados, biscoitos e carne às prefeituras, perderam espaço. As terceirizadas entregam parte da
comida já pronta. O que está
em jogo é um mercado de R$ 2
bilhões em 2009.
O plano das empresas consistiu em usar os serviços do advogado -sem revelar nos documentos seus vínculos com as
empresas- para impugnar editais de licitações lançados pelas
prefeituras, propor ações judiciais e fazer denúncias aos tribunais de contas, Ministério
Público e imprensa sobre eventuais irregularidades. Isso teria
ocorrido em pelo menos 120 licitações, principalmente em
Estados do Sul e do Sudeste.
A estratégia de combater a
terceirização foi trazida à tona
pelo próprio advogado das empresas, Sidney Melquíades de
Queiroz. Dizendo-se prejudicado pelo fim do suposto contrato
informal que mantinha com as
empresas, ele entrou com uma
ação trabalhista, ainda não julgada, na 2ª Vara do Trabalho de
São Caetano, para obter indenização.
A ação trabalhista foi localizada e revelada à Folha pela assessoria jurídica da SP Alimentação, empresa terceirizada
sob investigação do Ministério
Público por suspeita de irregularidades no fornecimento da
merenda. Intrigados com as
ações de Queiroz em vários
municípios ao mesmo tempo
-e especialmente em São Paulo, onde prestou depoimento
ao Ministério Público e fez, em
2007, uma denúncia formal
contra o prefeito Gilberto Kassab (DEM)-, os advogados da
SP decidiram investigar Queiroz.
Na petição da ação trabalhista, o advogado descreveu as
principais metas do que ele
chamou de "consórcio informal" das empresas: "Não permitir o avanço do sistema de
terceirização no município de
São Paulo; [e] impedir que o
sistema de terceirização se iniciasse junto [sic] ao governo de
São Paulo".
O trabalho incluía "coletar o
máximo de informações desabonadoras dos municípios
[prefeituras] já atendidos pelo
sistema terceirizado" e "buscar
apoio político com vereadores,
deputados estaduais ou federais, sempre de oposição, para
reforçar as denúncias".
Queiroz anexou à ação vários
e-mails que ele trocou com os
empresários, principalmente
Marcos Antônio Ferreira, diretor da AIM Comércio, representante da Sadia e das bolachas Mabel em São Paulo.
Em uma das mensagens,
Ferreira descreve reuniões entre os empresários e a necessidade de fazer uma "caixinha"
para remunerar Queiroz e duas
nutricionistas que deveriam fazer laudos para dar base às denúncias.
Ferreira dividiu os custos em
11 empresas, e cada uma deveria colaborar com R$ 2.000
mensais por um prazo inicial
de três meses. Segundo Queiroz, o sistema durou de janeiro
de 2006 a "meados de 2008".
O advogado moveu a ação
trabalhista contra AIM, Sadia,
Cathita, Conservas Oderich,
ATV, Frisa, Fábrica Mabel,
CCM, Biolac, Biscoito Dunga e
Socom Alimentos. As empresas
ainda não foram notificadas
pela Justiça sobre o assunto.
Os advogados da SP Alimentação protocolaram na Justiça,
no último dia 22, um pedido de
busca e apreensão de documentos na sede da AIM e revelaram a ação trabalhista. Ouvidos pela juíza, os promotores
de Justiça pediram a abertura
de um inquérito policial. "De
fato, as diversas correspondências eletrônicas juntas pelo requerente, extraídas de ação
trabalhista, e a conta corrente
aberta por Marcos Ferreira e
Otávio Gottardi indicam um
quadro indicionário da ocorrência de crime previsto na lei
[das licitações] 8.666/93."
A juíza Ariane de Fátima Alves Dias não concordou com as
buscas, mas orientou a SP Alimentação a realizar uma notícia-crime na Justiça.
No ano passado, o advogado
Queiroz foi investigado por suposta falsidade ideológica. Ele
foi acusado de usar o nome de
uma outra pessoa ao tentar impugnar um edital para a compra de merenda escolar.
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