São Paulo, sábado, 30 de maio de 2009

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Ação judicial revela lobby contra a merenda

Advogado pede indenização a um grupo de 11 empresários que, diz ele, o contratou para fazer denúncias contra terceirização do setor

Trabalho incluía coletar dados desabonadores das cidades atendidas pelo sistema e "buscar apoio político para reforçar denúncias"


RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma ação na Justiça do Trabalho revela que um grupo de 11 empresários pagou um advogado para tentar impedir que prefeituras terceirizassem a merenda escolar.
Com a terceirização, essas empresas, que vendem enlatados, biscoitos e carne às prefeituras, perderam espaço. As terceirizadas entregam parte da comida já pronta. O que está em jogo é um mercado de R$ 2 bilhões em 2009.
O plano das empresas consistiu em usar os serviços do advogado -sem revelar nos documentos seus vínculos com as empresas- para impugnar editais de licitações lançados pelas prefeituras, propor ações judiciais e fazer denúncias aos tribunais de contas, Ministério Público e imprensa sobre eventuais irregularidades. Isso teria ocorrido em pelo menos 120 licitações, principalmente em Estados do Sul e do Sudeste.
A estratégia de combater a terceirização foi trazida à tona pelo próprio advogado das empresas, Sidney Melquíades de Queiroz. Dizendo-se prejudicado pelo fim do suposto contrato informal que mantinha com as empresas, ele entrou com uma ação trabalhista, ainda não julgada, na 2ª Vara do Trabalho de São Caetano, para obter indenização.
A ação trabalhista foi localizada e revelada à Folha pela assessoria jurídica da SP Alimentação, empresa terceirizada sob investigação do Ministério Público por suspeita de irregularidades no fornecimento da merenda. Intrigados com as ações de Queiroz em vários municípios ao mesmo tempo -e especialmente em São Paulo, onde prestou depoimento ao Ministério Público e fez, em 2007, uma denúncia formal contra o prefeito Gilberto Kassab (DEM)-, os advogados da SP decidiram investigar Queiroz.
Na petição da ação trabalhista, o advogado descreveu as principais metas do que ele chamou de "consórcio informal" das empresas: "Não permitir o avanço do sistema de terceirização no município de São Paulo; [e] impedir que o sistema de terceirização se iniciasse junto [sic] ao governo de São Paulo".
O trabalho incluía "coletar o máximo de informações desabonadoras dos municípios [prefeituras] já atendidos pelo sistema terceirizado" e "buscar apoio político com vereadores, deputados estaduais ou federais, sempre de oposição, para reforçar as denúncias".
Queiroz anexou à ação vários e-mails que ele trocou com os empresários, principalmente Marcos Antônio Ferreira, diretor da AIM Comércio, representante da Sadia e das bolachas Mabel em São Paulo.
Em uma das mensagens, Ferreira descreve reuniões entre os empresários e a necessidade de fazer uma "caixinha" para remunerar Queiroz e duas nutricionistas que deveriam fazer laudos para dar base às denúncias.
Ferreira dividiu os custos em 11 empresas, e cada uma deveria colaborar com R$ 2.000 mensais por um prazo inicial de três meses. Segundo Queiroz, o sistema durou de janeiro de 2006 a "meados de 2008".
O advogado moveu a ação trabalhista contra AIM, Sadia, Cathita, Conservas Oderich, ATV, Frisa, Fábrica Mabel, CCM, Biolac, Biscoito Dunga e Socom Alimentos. As empresas ainda não foram notificadas pela Justiça sobre o assunto.
Os advogados da SP Alimentação protocolaram na Justiça, no último dia 22, um pedido de busca e apreensão de documentos na sede da AIM e revelaram a ação trabalhista. Ouvidos pela juíza, os promotores de Justiça pediram a abertura de um inquérito policial. "De fato, as diversas correspondências eletrônicas juntas pelo requerente, extraídas de ação trabalhista, e a conta corrente aberta por Marcos Ferreira e Otávio Gottardi indicam um quadro indicionário da ocorrência de crime previsto na lei [das licitações] 8.666/93."
A juíza Ariane de Fátima Alves Dias não concordou com as buscas, mas orientou a SP Alimentação a realizar uma notícia-crime na Justiça.
No ano passado, o advogado Queiroz foi investigado por suposta falsidade ideológica. Ele foi acusado de usar o nome de uma outra pessoa ao tentar impugnar um edital para a compra de merenda escolar.


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