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Moradores contam mortos e perdas no Piauí
Sobe para 6 o número de pessoas que morreram após ruptura da barragem de Algodões 1, em Cocal, na quarta-feira
Agricultor foi resgatado ontem, após ter a filha arrancada de suas mãos pela água e passar quase 2 dias no alto de uma árvore
LAURA CAPRIGLIONE
ENVIADA ESPECIAL A COCAL (PI)
Francisco das Chagas Alves
dos Santos, 23, desceu ontem
do helicóptero que o resgatou
do alto de árvore em que se refugiou por quase dois dias. Desceu como um santo supliciado.
Tinha o rosto, tronco, pernas,
pés, mãos e braços retalhados.
E o olhar perdido.
Morador de uma localidade
de Cocal, município a 282 km
de Teresina, ele foi surpreendido por volta das 16h de quarta-feira quando os 10 milhões de
metros cúbicos de água (um
quinto da capacidade da obra)
represada do rio Pirangi vazaram quase que de forma instantânea após o rompimento da
barragem de Algodões 1.
Assim que ouviu o rugido das
águas quebrando tudo no caminho, Santos (que, como seus vizinhos, ouvia falar que a barragem podia estourar a qualquer
momento) agarrou a filha pequena, de um ano e três meses,
e saiu correndo de casa.
No meio da fuga, um turbilhão de água com lama, pedras
e casas moídas alcançou-o e jogou-o e à menina em seus braços sobre uma cerca de arame
farpado, cujos mourões também tinham sido arrancados.
Pai e filha enrodilhados na
cerca, vestidos de espinhos,
submergiram muitas vezes enquanto eram arrastados por
centenas de metros. Até que
bateram em um cajueiro.
A força da correnteza enfiava
mais e mais os espinhos nos
dois. Na tentativa de se livrar e
à menina das farpas, o pai soltou uma das mãos com que a
agarrava. A outra não deu conta. Ali, Raissa da Silva Santos
sumiu na correnteza.
Ontem, quase dois dias depois, Francisco foi resgatado
com a mulher (perna quebrada) e o que sobrou da família.
Das oito pessoas que moravam
na casa pobre dos agricultores,
perdeu a mãe, Francisca. O cunhado Francisco seria enterrado ontem. Uma outra menina,
Tais, está entre os desaparecidos na tragédia. Tainara, que
também morava com a família,
foi enterrada ontem.
Segundo o governo Wellington Dias (PT), a ruptura da barragem de Algodões matou seis
pessoas "com nome, atestado
de óbito e caixão", conforme
explicou o secretário estadual
de Segurança, Robert Rios.
"Não nos posicionamos a respeito de boatos", disse ele, que
não quis comentar declarações
dadas poucos minutos antes
por uma médica das equipes de
buscas, que às 11h, dizia já haver
nove mortos confirmados.
Quatro caixões embrulhados
em papel pardo, mas cuja forma típica não conseguia esconder para que serviam, foram
embarcados logo cedo em um
helicóptero com destino ao povoado de Boiba, também à jusante do Pirangi.
Na mesma aeronave enviou-se médico (para o atestado de
óbito) e um policial para cuidar
dos aspectos legais dos enterros, que deveriam ocorrer no
próprio local das mortes. Segundo Rios, era "por respeito a
uma tradição e não para esconder os mortos".
Outras equipes, com médicos, paramédicos e assistentes
sociais, incluindo uma psicóloga, eram enviadas em um dos
quatro helicópteros disponíveis, para resgatar flagelados e
prestar os primeiros socorros.
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