|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
HABITAÇÃO POPULAR
Segundo arquitetos, cômodos construídos sem critério são perigosos, além de faltar iluminação e ventilação
Disseminado, "puxadinho" ganha inimigos
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Não é preciso andar muito pelas
ruas de São Paulo para encontrar
casas com algum tipo de "puxadinho". Seja na periferia, seja em
bairros de classe média, construir
mais um cômodo junto à casa,
sem nenhum projeto ou orientação, faz parte da rotina. Preocupados com essas obras, arquitetos e
até um pastor (leia nesta página)
começam a se organizar para
combater os "puxadinhos".
Uma das iniciativas parte do escritório de arquitetura Vista Urbana, que há dois anos resolveu
ajudar entidades comunitárias da
capital que funcionam em prédios ampliados à base dos "puxadinhos". Depois de estudar as
construções de dez associações,
eles elaboraram projetos com
custo baixo para reformá-las.
Duas entidades já estão em obras
e oito buscam patrocinadores para legalizarem sua situação. Todas
as propostas estão expostas na 6ª
Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo.
"Não bastava condenar os "puxadinhos", tínhamos de começar
a combatê-los", diz Caio Marin,
um dos sócios do escritório. "Começamos pelas associações, que
atendem um grande número de
pessoas." O próximo plano é implantar escritórios na periferia para orientar a população sobre como fazer construções. "Sabemos
que esta idéia é mais utópica e
complexa, mas é necessária porque as obras são feitas como se
fossem colchas de retalho."
A casa do pintor Amaro Teixeira de Andrade, 55, no Jardim Macedônia, zona sul, é assim. Primeiro ele construiu uma casa no
fundo do terreno inclinado que
comprou na rua Jorge Colaço.
Depois, fez mais uma casinha no
meio do terreno, grudada na anterior, e agora trabalha em mais
um cômodo, bem na parte da
frente, que ainda não sabe para
que vai servir. "Pode ser um salão
ou até uma nova casa. Quem sabe
eu não pego minha mulher e venho morar aqui?" Hoje, ele vive
com três filhos e um neto na casa
de baixo. A do meio está vazia
porque falta a parte elétrica.
Andrade conta que aprendeu a
construir quando foi ajudante de
pedreiro, em 1969. "O segredo é
saber assentar os blocos. Minhas
obras nunca deram problema e
nunca tive a ajuda de nenhum engenheiro." A construção do terceiro cômodo começou há três
anos e vai sendo tocada conforme
sobra dinheiro. "Já gastei mais de
R$ 4.000 porque o material é caro.
Aos poucos, a gente acaba."
Nessa história de esperar o dinheiro, já faz 20 anos que Maria
Aparecida Roza, vizinha de frente
de Andrade, começou seu "puxadinho". Na parte de cima da casa,
construída pelo irmão "sem planta nem medida", ela começou a
fazer quartos para seus dois filhos.
"Só tinha um na parte de baixo e
dormia todo mundo junto. Precisava de mais espaço, mas ainda
não deu para terminar." Mesmo
assim, os cômodos são usados. "O
problema é que está tudo despencando. Em volta das janelas, o tijolo começou a cair. Se tivesse ajuda, faria bem feito."
As casas de Andrade e Roza não
são exceção. Na rua onde moram,
apenas uma ou duas, contam, não
tem seu "puxadinho". "Toda casa
tem seu arremedo. A família cresce e a gente aumenta", explica Roza. O problema, diz Marin, é que
essas construções pioram a qualidade de vida das famílias. "É claro
que tem o perigo de alguma parte
cair, porque as obras não têm
projeto nenhum, mas o que mais
acontece são os problemas de insalubridade, como falta de iluminação e de ventilação."
Além disso, a circulação nessas
casas é complicada. "Os cômodos
costumam ser muito pequenos,
amontoados, porque são feitos
aleatoriamente", afirma. "Acreditamos que 90% das casas da periferia sejam construídas pelos próprios moradores ou por vizinhos,
sem orientação nem aprovação
da prefeitura. Pedreiros com uma
base mínima vão levantando paredes e não há fiscalização."
As secretarias da Habitação e de
Subprefeituras da capital informaram que não têm o levantamento de quantos "puxadinhos"
ilegais existem na cidade. O Instituto de Arquitetos do Brasil, departamento de SP, também não
tem números, mas seu presidente, Paulo Sophia, diz que fazer esses cômodos é um hábito comum
e perigoso. "Em geral, a casa foi
construída com critério, e o "puxadinho", não. Ele é um complemento não previsto no projeto
original e pode comprometer toda a estrutura da obra." Ele lembra que esse tipo de obra não é exclusividade da periferia. "Tem na
cidade toda, até em bairros ricos.
É que lá eles não são notados. Mas
também podem causar problemas porque invadem as áreas verdes e de permeabilidade do solo."
Texto Anterior: Festa conta com segurança privada Próximo Texto: Frase Índice
|