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Seguro de dirigente cobre até assédio sexual
Contrato foi feito por estatais como Metrô, CPTM, EMTU e Sabesp; benefício não inclui casos comprovados de dolo ou má-fé
O temor de especialistas é que esse tipo de blindagem a executivos de estatais possa facilitar atos descuidados ou polêmicos no aspecto legal
ALENCAR IZIDORO
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL
Estatais do governo de São
Paulo, como Metrô, CPTM,
EMTU e Sabesp, contrataram
seguros milionários para livrar
seus dirigentes de pagar indenizações por eventuais irregularidades cometidas no cargo.
A cobertura pode garantir
que, se forem condenados pela
Justiça -por contratos lesivos,
danos ambientais e até assédio
moral e sexual, por exemplo-,
a seguradora é que deve assumir as punições financeiras.
Se tiverem bens bloqueados,
alguns podem inclusive receber valores de até R$ 3 milhões
para que se mantenham.
"É estranho a estatal pagar
um seguro desses para um dirigente. Se alguém foi condenado, é porque cometeu uma irregularidade, agiu de forma indevida", afirma Paulo Boselli,
professor da Fatec de São Paulo
e consultor de licitações.
As situações cobertas se referem à responsabilidade civil
(como casos de imperícia, imprudência ou negligência), e
não criminal, dos dirigentes. O
seguro não arca com os custos
nos casos em que ficar comprovado que houve dolo ou má-fé
-se a Justiça concluir que houve corrupção, por exemplo.
As estatais da gestão José
Serra (PSDB) ligadas ao setor
de transporte firmaram seus
primeiros contratos desse tipo
a partir de abril deste ano. Afirmam seguir uma orientação do
governo do Estado.
Metrô, CPTM e EMTU afirmam que, juntas, devem gastar
R$ 644 mil por ano com esse seguro -cuja cobertura pode
atingir até R$ 30 milhões.
Já a Sabesp, que paga R$ 1,26
milhão por ano, diz ter cobertura do tipo desde 2002, na gestão Geraldo Alckmin (PSDB).
A orientação para que as estatais alterassem seus estatutos sociais e padronizassem esse seguro partiu do Codec
(Conselho de Defesa dos Capitais do Estado), órgão do governo que disciplina os procedimentos de gestão de pessoal.
Mas ele diz que a decisão de
contratar os seguros cabe a cada uma das empresas.
Blindagem
O temor de especialistas consultados pela Folha é que esse
tipo de blindagem aos dirigentes de estatais, ao reduzir seu
nível de responsabilidade por
indenizações financeiras, possa facilitar atos descuidados ou
polêmicos no aspecto legal.
"Claro que, dentro do direito,
há temas questionáveis, opiniões divergentes. Mas, se esse
seguro fosse razoável, por que
só valeria para dirigentes, e não
aos funcionários de menor escalão?", questiona Boselli.
O ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e da
Justiça Paulo Brossard disse à
Folha nunca ter ouvido falar
antes nesse tipo de cobertura
aos dirigentes de empresas públicas. Até por isso, não tem
opinião formada a respeito.
Mas faz duas ponderações.
De um lado, afirma que "a remuneração no serviço público
costuma ser modesta" diante
dos riscos e responsabilidades
que eles têm de assumir. De outro, Brossard declara: "As melhores medidas podem muitas
vezes resultar em abusos".
Herdeiros
O maior valor de cobertura
dos contratos identificados pela Folha é da Sabesp, num total
de R$ 80 milhões. O seguro pode ser extensivo aos herdeiros
e representantes legais e marido ou mulher.
Entre os processos que poderiam ser cobertos pelo seguro
há ações movidas pelo Ministério Público contra ex-dirigentes da Sabesp que contrataram
escritórios de advocacia sem licitação, de 1996 a 2005.
Existe apuração também sobre a participação societária de
um dos administradores em
uma empresa de engenharia
contratada pela Sabesp.
Também há inquérito sobre
possíveis irregularidades no
contrato para fornecimento de
água não potável. A Sabesp vinha fornecendo 63 milhões de
litros de água potável por mês
para uma fábrica de papel, mas
cobrava pelo preço de água de
reuso, que vem do tratamento
de esgoto e é mais barata.
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