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DANUZA LEÃO
Hay otros
Quando o telefone toca e a
secretária diz que seu patrão quer falar com você, qual o
primeiro (e único) pensamento
que te ocorre? "É a demissão"
-claro. Depois da conversa, ótima, você volta a fita, raciocina e
se dá conta de que, se fosse para te
demitir, ele mandaria outra pessoa. Elementar, mas não adianta:
todo mundo é inseguro, mesmo
aqueles que dão a impressão de
serem os mais seguros do mundo.
Só se é seguro com as coisas que
tanto faz; mas, quando você olha
aquele vestido maravilhoso na vitrine, não compra, mas fica pensando nele sem parar e resolve
voltar no dia seguinte, não consegue dormir, pensando que, quando chegar à loja ele já terá sido
comprado. E quando o objeto do
seu desejo é muito importante,
mas muito importante mesmo,
você vai pensar que talvez não
consiga chegar lá porque o trânsito pode estar interrompido, que a
proprietária pode ter morrido e
por isso a loja vai estar fechada,
esse tipo de coisa.
Quando encontra o apartamento dos seus sonhos, enquanto
o despachante está examinando a
documentação, são três tranquilizantes por dia. É claro que a cidade inteira, o universo inteiro só
quer uma coisa: aquele mesmo
apartamento. E sendo assim, alguém vai chegar e oferecer o dobro do preço sem se importar se a
papelada está ou não em ordem, e
você vai ficar sem ele, claro. Ele, o
único apartamento do mundo.
Já quando você resolve vender o
seu, por mais maravilhoso que seja, uma certeza você tem: ninguém, nin-guém, vai se interessar
por ele. Não importa que seja de
frente para o mar e tenha uma
vista esplendorosa, varanda e ar-condicionado central e que o preço esteja mais do que justo. Mentalmente você já se prepara para
fazer um desconto -10% ou
20%, o que quiserem, o que oferecerem; num momento de total insegurança, você chega a pensar
em doar o imóvel para uma instituição de caridade -se alguma
delas quiser, o que não é certo.
Os paranóicos de carteirinha
vão mais longe: basta que o telefone toque para que eles estremeçam, com medo de uma má notícia. E se tocar de madrugada, aí é
tragédia certa. E existem também
aqueles que estão com a vida ótima, tudo em cima, todo mundo
com saúde, os amigos bem de vida e passam o tempo se perguntando quanto tempo aquilo vai
durar. Ninguém é feliz para sempre; por que ele seria? E se tiver
uma doença grave? Doença não
avisa, e 50% da população com
mais de 85 anos sofre do mal de
Alzheimer. Ele tem 42, mas um
dia vai ter 85 - isso se viver até
lá. E quando isso acontecer, quem
vai cuidar dele?
E quando telefonam do laboratório para dar o resultado do exame de sangue? E quando o namorado te deixa?
Homens e mulheres deixados,
dos 15 aos cem anos, nesse momento pensam exatamente a
mesma coisa: nunca mais vou arranjar outro/outra. Não adianta
nada que você seja linda, inteligente, charmosa, interessante. Sabe o que é nunca mais? Pois é:
nunca mais. E a coragem para se
levantar da cama de
manhã? Se não tivesse de trabalhar, ficava deitada o dia inteiro,
bem vaga, se achando o lixo da
humanidade. Aliás, ela merece:
nunca foi uma boa filha, uma boa
mãe nem uma boa amiga e está
apenas colhendo o que plantou. E
se no lugar de dedicar tanto tempo aos prazeres da vida tivesse se
engajado a sério num projeto político, o país não estaria do jeito
que está. A culpa de tudo é dela,
claro.
Não há nenhum exagero em
nada que você leu; todas as pessoas são assim.
Mas existem pessoas como a sábia Maria Felix, que, num belo
documentário passado na televisão em sua homenagem, declarou
que nunca sofreu por um homem,
porque nessa hora sempre pensou: "Hay otros".
"Hay otros" -e isso vale para
quase tudo.
E-mail -
danuza.leao@uol.com.br
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