São Paulo, segunda-feira, 31 de agosto de 2009

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Começo confuso

No seu primeiro dia, ciclofaixa em São Paulo atrai 9.200; ciclista divide espaço com pedestre, skatista e patinador

Apesar das orientações feitas por 130 monitores escalados pela CET, maioria dos frequentadores não respeitou faixa de pedestre


Letícia Moreira/Folha Imagem
Ciclistas cruzam faixa de pedestres na avenida Ibirapuera, durante percurso da ciclofaixa inagurada ontem em SP; alguns não desmontaram da bicicleta, o que fere o Código de Trânsito Brasileiro

ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA

Parecia que a orientadora de ciclistas Alessandra Andrade, 22, falava grego. Ninguém entendia muito bem o ela queria dizer ao repetir "travessia desmontado" aos paulistanos que foram experimentar o primeiro dia da ciclofaixa de São Paulo. Às 9h de ontem, duas horas depois da abertura do trajeto, na zona sul, ela estava rouca.
Quando não há travessia específica para ciclista, ele tem que atravessar desmontado, ou seja, deve descer da bicicleta e caminhar como pedestre.
Parece óbvio. "Mas nem todo mundo compreende", disse outro orientador, Marlon Moraes, 23, que manuseava uma bandeira de "Pare" e repetia a frase da colega. "Também precisa descer da bike porque nem todas as calçadas são rebaixadas. Muitas estão irregulares. O ciclista pode cair", complementou Alessandra.
Pouca gente dava ouvido. Até mesmo quem conduzia bicicletas em nome da organização desrespeitava a regra, prevista no Código de Trânsito Brasileiro. Cerca de 9.200 pessoas, entre ciclistas, skatistas e patinadores, passaram pelo trajeto de 5 km que liga os parques do Povo, Ibirapuera e das Bicicletas. Não foram registrados incidentes durante o funcionamento, das 7h às 12h, segundo informações da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).
Teve ainda quem pedalasse fora da ciclofaixa, principalmente no trecho entre as avenidas República do Líbano e Ibirapuera, em direção ao parque das Bicicletas. A justificativa foi o pouco tempo para atravessar a faixa de pedestres da República do Líbano. São apenas 12 segundos de sinal verde, conforme cronometrou a Folha, o que gerou (pode acreditar) engarrafamento de bike.
O problema continuou na calçada do parque. Pequenos adesivos colados em dois cavaletes tentavam informar a continuidade da ciclofaixa. Pedestres e ciclistas não sabiam que rumo tomar. "Isso aqui está confuso. Ainda mais com esse volume de bicicletas", criticou a arquiteta Andrea Spagna, 34.

CET reavalia
Durante três vezes, a reportagem tentou ouvir o secretário municipal dos Transportes, Alexandre de Moraes. Mas sua assessoria de imprensa escalou para falar o gerente de operações da CET, Sebastião Barbosa Muniz, 56. "Vamos fazer uma reavaliação nesta semana para aprimorar a operação."
Ontem, trabalharam na ciclofaixa 42 agentes da companhia e 130 monitores treinados para orientar os ciclistas.
"Quase segui direto e saí da ciclofaixa. Faltou indicação de conversão", disse o advogado Adolfo Machado, 55. Dono de uma bike projetada especialmente para superfícies planas, criticou a travessia desmontada em todo o trajeto. "Há trechos em que só passa bike."
Na entrada do parque do Povo, a estudante Gabriela Siqueira, 18, achou complicado compartilhar a calçada. "Se você for desviar de um pedestre, pode ir direto para a rua. É perigoso."
Há dois anos em São Paulo, a norte-americana Sarah Kemme, 49, respirava, enfim, aliviada. "É o começo, para educar as pessoas. Quando eu era criança, não havia faixa de bike nos EUA. Aqui, vai levar tempo."
Sarah e o marido Bill, 53, não têm carro. Para os dois, andar de bike durante a semana em São Paulo é "um pesadelo". "Ideal seria uma faixa permanente. Não só para recreação", diz ele. "Tomara que a bicicleta se torne uma alternativa de transporte", complementa ela.
Acompanhado da mulher, Cristina, 29, e do filho, Diego, 7, o administrador de empresas Glauco Carramillo, 37, definiu a ciclofaixa da seguinte forma: "É uma tentativa para o paulistano sair dos muros."


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