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Sem centro de apoio, ação da PM espalha craqueiros na cidade

Complexo de atendimento de usuários de drogas no centro paulistano será inaugurado só daqui a um mês

Coronel diz que vai acabar com o tráfico naregião em 30 dias; à noite, Folha flagra venda de droga na rua

VANESSA CORREA
TALITA BEDINELLI
DE SÃO PAULO

A operação da Polícia Militar deflagrada anteontem na cracolândia, região central de São Paulo, ocorreu sem que um complexo voltado para usuários de crack, com equipamentos de saúde, fosse inaugurado pela prefeitura.

O novo espaço, cuja abertura está prevista para apenas daqui a 30 dias, terá um centro de convivência para 1.200 pessoas, incluindo crianças, e albergue. O complexo terá também um Caps (Centro de Atenção Psicossocial) e um posto de saúde.

Como consequência da ação da PM iniciada anteontem, usuários de crack se espalharam por outras áreas da cidade. A Folha viu grupos em pontos onde não costuma haver concentração de viciados, como na praça Princesa Isabel e no canteiro da av. Duque de Caxias.

O comandante-geral da PM, coronel Álvaro Camilo, disse que a operação tem o objetivo de desmontar o tráfico na cracolândia. "Em 30 dias a polícia vai identificar traficantes e cortar a chegada de crack na região", disse.

Segundo a PM, 364 pessoas foram abordadas em dois dias de operação. Anteontem, dois suspeitos de tráfico foram presos. Ontem, nenhum. No total, 150 pedras de crack foram apreendidas pela PM.

A polícia diz que a estratégia é deixar usuários sem a oferta de droga, para que fiquem mais propensos a pedir ajuda e tratamento.

A prefeitura disse que a operação da PM integra a Ação Integral Centro Legal, iniciada em 2009, mas não soube informar ontem se a procura de usuários por atendimento aumentou. Divulgou apenas que "23 crianças procuraram espontaneamente ajuda".

Por volta das 23h, apesar da presença da PM, uma multidão se reunia na rua Helvétia, perto do cruzamento com a av. Rio Branco. Os craqueiros, que passaram o dia sem a droga, estavam à espera dos pequenos traficantes. A reportagem presenciou a chegada de um táxi que, em poucos minutos, foi cercado por uma multidão.

Uma mulher desceu, vendeu as pedras e partiu. Minutos depois um carro da PM dispersou o grupo.

Nos últimos meses, um quarteirão da rua Helvétia foi ocupado por viciados. A prefeitura teve de mudar o trajeto de uma linha de ônibus.

CRÍTICAS

Funcionários de três centros de convivência onde moradores de rua podem tomar banho, passar o dia e ser encaminhados para atendimento médico, afirmam que o número de usuários dobrou desde o início da ação policial.

Segundo eles, os viciados temiam ser presos.

Especialistas consideram a ação da PM "higienista". Dizem que ela atrapalha o trabalho dos agentes de saúde, que buscam criar vínculos com os usuários para encaminhá-los para tratamento. "Pode destruir um trabalho de anos", diz Dartiu da Silveira, diretor do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp.

O comandante da PM afirmou que a polícia abordará quem estiver consumindo crack na rua, o que não acontecia antes devido a uma "dificuldade do poder público agir" na região.

A PM diz que ocupará a cracolândia por ao menos 30 dias. Em 2009, quando a ação Centro Legal foi iniciada, a polícia dizia que faria a ocupação permanente da área com 70 homens, o que não ocorreu -antes do início da nova operação, de anteontem, apenas 12 PMs patrulhavam a área.

A cracolândia é alvo de um projeto de mudança urbana que prevê a desapropriação e demolição de cerca de 30% da região da Santa Ifigênia.

A gestão do prefeito Gilberto Kassab (PSD), inclusive, rebatizou o local de Nova Luz. A transformação ficará a cargo de uma empresa privada, que poderá fazer as desapropriações e vender os terrenos com lucro.

Colaborou LAURA CAPRIGLIONE

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