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Walter Ceneviva

Leis da natureza e dos homens

A Carta Magna diz ser dever da União o planejamento e a promoção da defesa contra calamidades públicas

O NOTICIÁRIO internacional destacou o fato de que o verão ao norte do equador, em meados do ano passado, foi marcado por calor alto e chuvas intensas, ceifando vítimas humanas. Depois, vieram frio e muita neve na faixa do trópico de Câncer. Formaram-se espessas camadas de gelo, contrastadas ao sul do equador por temperaturas a quase 50°C, além de chuvas torrenciais.

Em que medida as condições climáticas interessam ao direito? Em pequena parte. São fatos da natureza, em regra estranhos às garantias jurídicas. Mesmo assim, será inevitável voltar a elas de tempos em tempos. Serve de exemplo atual o de gaúchos, catarinenses e paranaenses, que ora têm dramas pessoais causados pela muita chuva, ora se lamentam da longa seca, com repercussão jurídica evidente em vidas e em prejuízos.

Em um país imenso como o nosso, mais para o norte do trópico de Capricórnio (que passa por São Paulo) e acima do equador (na foz do Amazonas) o ano tem, normalmente, áreas ou de chuvas ou de secas. Só dois tipos. Acima de Alagoas tem acontecido, com insuficiências de planejamento e conservação, oceanos de águas da chuva e seus carros flutuantes. Nas áreas de seca, as insuficiências materiais e morais do combate por açudes parecem eternizar-se.

O perfil do direito nos leva à aferição do art. 182 da Constituição. Está no capítulo dos princípios gerais da política econômica. É a vida urbana com óculos do dinheiro. Esse dispositivo exibe a política urbana como alvo do desenvolvimento social da cidade, para o bem-estar dos habitantes. Ou seja, cada vez em que o bem-estar do morador da cidade não é garantido nasce o direito, em tese, de um ou mais de um deles, de processar o prefeito ou o diretamente responsável pela missão. Não espere, porém, uma indenização breve ou fácil. O poder tirará de sua cartola processual coelhos da demora no protelar a decisão cabível, com participação do Legislativo ou omissão do Judiciário.

Paradoxalmente, o meio ambiente (art. 225), primo da política urbana, está no capítulo da ordem social, embora o bom ambiente seja direito de todos e dever do Estado. No todo não é realidade exigível, mas o cidadão deve manter-se atento. A omissão do dever por quem não adote medidas cabíveis deve responder pelo dano decorrente do fenômeno natural mal cuidado. Embora a Carta Magna tenha parágrafo indicativo dos modos de realizar o direito, a estatística não traz, proporcionalmente, muitas ações em juízo sob tal fundamento.

No inciso XVIII do art. 21, a Carta Magna afirma ser dever da União o planejamento e a promoção da defesa permanente contra calamidades públicas, especialmente secas e inundações, juntamente com Estados e municípios, sob as mesmas diretrizes enunciadas. Não é possível, para o direito ou para as ciências físicas, opor medidas preventivas finais, definitivas para plena correção das consequências de fenômenos da natureza ou para reparar todos os seus danos.

Nem mesmo sabemos se a chuva intensa ou a seca em largas áreas mudaram (ou não) o perfil do planeta. Se mudaram, chegou a hora de trocar de remédio. Verdade é, porém, que os ataques da natureza estão cada vez mais fortes, em velocidade crescente. Olho neles. Quem avisa amigo é.

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