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Difícil andar, impossível parar

Com quase 1 veículo para cada morador com mais de 16 anos, cidade perde vaga na rua

VAGUINALDO MARINHEIRO
DE SÃO PAULO

Todo paulistano reclama do trânsito, mas mais difícil que circular com o carro está parar nas ruas de São Paulo.

A questão é matemática: o número de veículos só cresce. Na média, 538 novos foram registrados na cidade a cada dia do mês de fevereiro.

A frota já alcança 7.222.769, o que significa que estamos muito próximos de ter um veículo para cada morador com mais de 16 anos. Ao mesmo tempo, cai o número de vagas para estacionar nas ruas.

Desde 2009, a prefeitura proibiu o estacionamento em algumas vias de ao menos cinco bairros da cidade: Jardins, Itaim, Pinheiros, Vila Olímpia e nos arredores da avenida Luiz Carlos Berrini.

À noite, o problema piora com o total de veículos que pernoita nas ruas.

Muitas famílias têm hoje quatro, cinco carros, e em bairros com urbanização mais antiga (como Jardins, Higienópolis ou mesmo o Itaim), a maioria dos prédios não conta com mais de duas garagens por apartamento.

Ou seja, há mais veículos disputando os mesmos lugares à noite.

A reportagem testou.

Na quarta e na quinta-feira à noite, buscou vagas em ruas de Higienópolis (Bahia, Alagoas, Sergipe) e Itaim (Itacema, Pedroso Alvarenga, Jesuíno Arruda), nada. Todas estavam tomadas.

Sem ter onde parar, muitos paulistanos estão usando o serviço de manobristas de restaurantes desses bairros quando vão visitar parentes ou amigos.

A prefeitura afirma que a redução de espaços para estacionar na rua tem duas funções: aumentar a fluidez do trânsito, com mais faixas para a circulação, e ao mesmo tempo inibir o uso de carros.

"Isso é uma política adotada por muitas cidades no mundo. A dificuldade ao achar uma vaga na rua ou o preço cobrado por estacionamentos privados acaba fazendo com que as pessoas pensem em outras formas de se locomover, além do uso automático do carro", diz o secretário municipal de Transportes, Marcelo Branco.

O urbanista Candido Malta concorda, em tese, com a medida, mas acha que ela não está surtindo efeito.

"As pessoas pagam os serviços de valets, cada vez mais caros, em vez de tentar alternativas ao carro", afirma.

Em alguns restaurantes, o preço passa de R$ 20.

Malta diz que o custo do estacionamento já está se transformando numa espécie de pedágio urbano, tema que a prefeitura não tira da gaveta por medo de desgaste eleitoral. "Mas a situação está num ponto que as pessoas vão acabar concordando que não há outra saída senão cobrar daqueles que queiram circular pelo centro expandido", continua Malta.

"Dizem que é elitista, que há discriminação pelo poder econômico. Mas qual a alternativa? Sortear quem poderá usar o carro?"

FERTILIDADE

A questão dos estacionamentos e do trânsito intriga governos em todo o mundo. Nos Estados Unidos, Donald Shoup, um professor da Universidade da Califórnia, acabou se tornando um guru dos planejadores urbanos ao sugerir altos preços para quem quiser estacionar nas ruas.

Suas ideias estão compiladas no livro "The High Cost of Free Parking" (o alto custo do estacionamento gratuito) e serviram de base para mudanças implantadas em Nova York e San Francisco, por exemplo.

Para Shoup, estacionamento fácil e barato funciona como "um remédio de fertilidade para os carros".

E também para o trânsito. Uma pesquisa constatou que 29% dos carros circulando no centro de Manhattan estavam apenas rodando quarteirões em busca de uma vaga.

Em São Paulo, deve acontecer o mesmo.

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