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Justiça dá a viciado direito de circular pela cracolândia Decisão de tribunal atende a pedido de dependente que mora na região Homem só poderá ser abordado pela PM se houver fundada suspeita de que esteja cometendo um crime
RAFAEL ITALIANI DO “AGORA” Um dependente de crack conseguiu no Tribunal de Justiça o direito de não ser abordado pela Polícia Militar sem que haja suspeita justificada. Frequentador da cracolândia, área degradada do centro de São Paulo que é alvo de uma operação policial desde janeiro, ele recorreu à Defensoria Pública depois de ser abordado 15 vezes por PMs no período de uma semana. "[As abordagens da polícia] tiravam os meus direitos de cidadão, direitos básicos de ir e vir. Houve um exagero e comecei a ser proibido de andar em uma rua ou outra", disse Carlos Eduardo de Albuquerque Maranhão, 41. Filho de uma família de classe média do Rio de Janeiro, o dependente de crack vive desde maio do ano passado na região da cracolândia. Antes, ele afirma ter morado na Bahia e na Alemanha com sua ex-companheira. Foi o fim do relacionamento que o fez ter uma recaída e voltar a usar crack. O dependente afirma que já tentou fazer três cursos superiores: direito em 1984, geografia em 2000 e filosofia em 2006. Nenhuma das vezes conseguiu concluí-los. Hoje, vive da coleta de materiais recicláveis. Diz que precisa de R$ 20 por dia para bancar sua estada em pousadas baratas e alimentação. OPERAÇÃO A operação policial na cracolândia tem como principal objetivo acabar com o uso de crack a céu aberto na área central da cidade de São Paulo. Logo em seu início, a PM chegou a usar bombas de gás e balas de borracha para espalhar as concentrações de usuários da droga. Em seguida, o governo Geraldo Alckmin (PSDB) proibiu o uso desses artefatos na operação. O clima entre dependentes e policiais continuou tenso a ponto de um carro da PM ser atacado por centenas de viciados após uma abordagem. A Defensoria Pública registrou 82 denúncias de dependentes a respeito de supostos abusos policiais. O órgão chegou a imprimir panfletos nos quais explicitava os direitos dos cidadãos, sejam dependentes químicos ou não. O panfleto, por exemplo, dizia que ninguém pode ser retirado de determinado local da rua contra a vontade. Também citava o direito de ir e vir das pessoas, agora concedido judicialmente a Maranhão. A PM diz que age dentro da lei. CONFLITOS Especialistas ouvidos pela reportagem dizem que há um conflito na decisão do TJ que beneficiou o morador de rua. Para João Antonio Wiegerinck, professor da Escola Paulista de Direito, a Justiça precisa resguardar o direito individual do cidadão de ir e vir, mas deve assegurar o direito coletivo pela segurança. "A polícia tem legitimidade para abordar o cidadão quantas vezes achar necessário, desde que haja uma suspeita contra ele", afirma. Para o professor de direito processual penal da PUC-SP Marcelo Custódio Erbella, a legislação não deixa claro o que é uma "fundada suspeita" de que o indivíduo esteja praticando um ato ilícito. "Uma abordagem não é objetiva. Muitas vezes o policial aborda o suspeito porque ele reagiu de maneira estranha ao ver a polícia. É subjetivo." O promotor de Justiça Eduardo Valério afirmou que concorda com a decisão. "Acho absolutamente correta e um precedente importante na defesa dos direitos cidadão face à violência do Estado", declarou. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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