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Gatinhos sofrem para conseguir sangue

Falta de estoque em hospitais de São Paulo dá origem a grupos no Facebook, que contam com até 500 membros

Desconhecimento e medo dos donos de felinos são apontados como motivos para baixa adesão à doação

MARIANA RIOS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Grudi, estimados seis anos, tem Aids felina. E precisa de transfusão de sangue a cada 15 dias, por causa do avanço da doença que provocou uma lesão na medula.

Ao contrário do que ocorre com cães, que contam com bancos de sangue consolidados e doadores fixos, não há estoque em hospitais veterinários para felinos.

Por isso, a cada 15 dias, a secretária Adriana Laranjeiras, 34, dona de Grudi, vive uma angústia para conseguir doadores.

"A situação é crítica. Não falo em estoques baixos, mas da ausência do produto em São Paulo e região metropolitana", afirma a veterinária Ludmila Moroz, que trabalha no banco de sangue do Hospital Veterinário da USP.

Lá, são feitas em média 20 coletas de sangue canino por mês e há uma lista de 120 cães doadores fixos. Para gatos, o número de bolsas não passa de seis; o de doadores, de 20.

O desconhecimento e o medo dos donos são apontados como razão para a baixa adesão ao banco felino. "O ideal seria, pelo menos, 70 gatos cadastrados", diz Ludmila.

Em situações de emergência, donos de gatos recorrem a grupos do Facebook, como "Cães e gatos salvam vidas doando sangue", com quase 500 membros.

Foi lá que Liene Rodeguero, 24, uma protetora de animais, viu o apelo inusitado para o gato Elvis. "Eu não sabia que era uma necessidade recorrente [o sangue]". Agora, dos 11 gatos dela, cinco estão cadastrados para doar.

Elvis, portador de doença congênita, chegou a receber sangue, mas não resistiu à demora. A dona se emociona ao lembrar. "A dor é a mesma de quem tem um parente na espera por um órgão", conta Rosana Chequetti, 23.

MORADOR DE RUA

Já Adriana conta que fez apelos para vizinhos, mas não conseguiu convencê-los. "Só quando você vivencia na pele, vê o quanto é importante", afirma ela, que tem 14 gatos -quatro doadores. Grumi, de 8 anos, doou sangue para Grudi, ex-morador de rua recolhido por Adriana.

Ela percebeu que algo não ia bem há dois meses. "Ele passou de um gato ativo para extremamente apático em dois dias." O vírus FIV, transmitido pela saliva, pertence à mesma família do HIV, mas não é transmitido aos humanos e a outros animais.

Para ajudar novamente, Grumi terá que aguardar um mês. Neste intervalo, Puff, dará o socorro. "Não tenho coragem de sacrificá-lo. Enquanto ele estiver lúcido, sem sentir dor, vou cuidar dele."

Além da Aids felina, gatos com doenças como leucemia e a micoplasmose (anemia infecciosa) precisam de transfusão constante.

Antes da doação, o gato é avaliado e faz um hemograma gratuito para ter certeza de que pode doar.

No procedimento para a coleta, o animal recebe uma injeção sedativa, com efeito levemente analgésico. Mas permanece acordado.

"Morro de dó. Fico me desculpando com eles por uma semana, deixo que roubem comida, durmam em cima de mim", conta Liene.

Não há efeito colateral. "O gato fica um pouco mais carente, chamamos de 'efeito amor'. Depois de umas oito horas, passa", diz Ludmila.

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