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Jovem não era bandido, dizem vizinhos

LAURA CAPRIGLIONE
DE SÃO PAULO

Eram 2h da terça-feira. A menina D., 16 anos, deitada no sofá, esperava o sono chegar. Pá, pá, pá, pá. "Parecia que tinha gente dentro de casa atirando", lembra.

D. se agachou, esperou os tiros cessarem e saiu para ver a rua. Abriu a porta da frente e, a menos de três metros dela, estava o amigo Fernando Pereira de Melo, 23, autônomo, olhos esbugalhados, pendurado no portão da casa, daqueles protegidos por lanças -uma delas havia-lhe traspassado o pescoço.

"Fernandooooooo", o grito da adolescente congelou a madrugada. O jovem olhou para ela, soltou um último gemido e morreu.

Melo, o morto, nasceu, cresceu e estudou naquele pedaço do Taboão da Serra. Terminou o ensino médio na Escola Estadual Neuza Demétrio. Na rua, era conhecido como rapaz gentil -"Se passasse aqui dez vezes, dez vezes cumprimentaria a gente", diz uma vizinha.

A avó do rapaz mora na rua em que o neto morreu. Provavelmente, Melo dirigia-se para a casa dela, quando foi encontrado pelos assassinos.

Não houve quem, na rua, se recusasse a falar do jovem. "Ele não tinha envolvimento com o crime", disseram.

Ninguém viu como foi o ataque. Sabe-se apenas que um outro jovem, acompanhante de Melo, recebeu cinco tiros, saiu correndo e safou-se. Está internado fora de perigo. Outro escondeu-se debaixo de um carro. Escapou ileso.

Melo tentou entrar na casa de D., pulando o portão de lanças. Foi alvejado nas costas, no quadril, no cotovelo e desabou sobre a lança.

No portão de aço e na parede da casa, ficaram as marcas de tiros -a perícia disse que eram balas de pistola.40.

A mãe de Melo, que mora pertinho, chegou ainda de madrugada e encontrou o filho pendurado. Tentou arrancá-lo da lança. Policiais impediram-na. "Assassinos, vocês é que mataram meu filho", ela gritou até desmaiar.

Os vizinhos, que nos fins de semana fecham a rua tranquila de periferia para transformá-la em área de lazer, prometem ir hoje juntos ao enterro, às 10h, no Cemitério Jesuíta.

ORDEM

D. e seus amigos dizem ter recebido ordens dos policiais para não saírem de casa depois das 22h. A mesma orientação teria sido passada a jovens em outros locais onde ocorreram crimes.

Como na frente de uma escola no Jardim Clementino, também periferia de Taboão, onde três homens e uma mulher foram alvejados pelos assassinos -dois morreram.

Em uma rodinha, a filha adolescente de Camila Grossi Monteiro, 30, atingida por tiros no pescoço, ombro e braço (ela está fora de perigo), era consolada pelos amigos da escola quando o carro da reportagem se aproximou.

Uma menina saiu correndo, de medo. "A gente agora tem de ficar dentro de casa, na prisão? Isso é justiça?", disse ela, depois de se acalmar.

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