São Paulo, quarta-feira, 01 de abril de 2009

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ANÁLISE

Aumento de gasto para combater recessão não passa de uma vontade

GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Na tentativa de conciliar a fome e a vontade de comer, a administração petista atribui o buraco orçamentário do primeiro bimestre ao que chama de política fiscal anticíclica, ou seja, a elevação dos gastos públicos destinada a combater a ameaça de recessão no país. Até aqui, porém, os dados mostram apenas fome -arrecadação insuficiente para bancar compromissos assumidos muito antes do agravamento da crise econômica global.
Do aumento de R$ 14,2 bilhões nas despesas, em comparação com janeiro e fevereiro do ano passado, nada menos de 90% são explicados por medidas, legislações e imprevistos sem nenhuma relação com decisões tomadas pelo governo Lula com objetivo de reanimar o consumo e o investimento.
A começar pela disparada da folha de salários do funcionalismo público, que sozinha responde por quase 40% dos novos gastos. Trata-se do resultado de um pacote de reajustes escalonados negociado com os sindicatos ainda no primeiro semestre de 2008, quando o máximo de conservadorismo na elaboração do Orçamento era a previsão de crescimento econômico de 4,5% neste ano, em vez dos 5% anteriores.
Outros 34% das despesas adicionais estão relacionados ao reajuste do salário mínimo, que segue uma regra definida dois anos atrás: aplica-se a inflação acumulada desde o reajuste anterior mais a variação do PIB do ano retrasado. Aposentadorias, pensões, auxílio-doença, benefícios assistenciais e seguro-desemprego crescem com o mínimo -e com o aumento do número de beneficiários, totalmente fora do controle do governo.
Nos programas e nas ações em que o presidente e seus ministros têm poder de decisão, o único aumento de gastos visível a olho nu, de R$ 2 bilhões, aconteceu na Saúde. Os gastos do setor, no entanto, seguem regra semelhante à do salário mínimo, mas definida muito antes, em 2000: eles sobem a cada ano conforme a inflação e a expansão do PIB do ano anterior.
Completam a conta sentenças judiciais contra o Tesouro e despesas adicionais dos poderes Legislativo e Judiciário, que têm autonomia orçamentária.
Já a tal política anticíclica não passa, ao menos nos resultados do bimestre, de uma vontade. Seu instrumento clássico, o investimento público, teve uma elevação contabilizada em casas depois da vírgula -de R$ 2,4 bilhões para R$ 2,7 bilhões. Se consideradas só as obras prioritárias em infraestrutura, livres de bloqueio de gastos, a alta foi de R$ 0,6 bilhão para R$ 0,8 bilhão, ou 1,4% do aumento total de gastos. Os subsídios ao setor agrícola passaram de R$ 0,6 bilhão para, arredondando para cima, R$ 1 bilhão.
Não houve, a rigor, política fiscal no período. Só neste mês, quando foi definida a programação orçamentária inicial para o ano, a área econômica indicou, sem afirmações categóricas, a intenção de perseguir metas fiscais mais frouxas no ano. Antes de sair do improviso, porém, é preciso saber até onde a receita vai cair.


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