São Paulo, quarta-feira, 01 de abril de 2009

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Queda na taxa de juros alivia piora fiscal

Arrecadação menor e mais despesa com funcionalismo reduzem superávit em 66% no 1º bi, mas Selic em baixa corta gasto com dívida

Gastos com salários do funcionalismo sobem 25% no primeiro bimestre, para R$ 27,6 bi; investimentos sobem 14% e vão a R$ 2,7 bi


NEY HAYASHI DA CRUZ
JULIANA ROCHA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A queda na arrecadação de tributos, causada pela crise e pelas desonerações para tentar estimular a economia, aliada a forte aumento dos gastos com o funcionalismo, causou uma deterioração nas contas públicas em fevereiro. Essa piora do quadro fiscal, porém, está sendo aliviada pela queda na taxa básica de juros, que reduz o custo da dívida pública.
O governo central, soma das contas do Tesouro Nacional, da Previdência e do Banco Central, registrou o primeiro déficit para um mês de fevereiro desde 1997, de R$ 926 milhões.
Ou seja, o dinheiro arrecadado naquele mês não foi suficiente para cobrir todos os gastos correntes da União -com servidores, saúde e educação, investimentos, entre outros.
A piora no desempenho fiscal do governo central se refletiu nos dados do setor público como um todo, que engloba Estados, municípios e estatais. No primeiro bimestre do ano, o superávit primário (resultado do setor público antes do pagamento dos juros da sua dívida) somou R$ 9,295 bilhões, uma queda de 66% em relação ao mesmo período de 2008.
No período de 12 meses encerrado em fevereiro, o resultado acumulado correspondeu a 3,43% do PIB. A meta do governo é chegar a 3,8%, embora desse número possa ser abatido até 0,5 ponto percentual para gastos em investimentos considerados prioritários em infraestrutura.
Nas contas do Banco Central, os cortes na taxa Selic que já ocorreram neste ano e que devem se aprofundar nos próximos meses devem fazer com que o setor público possa economizar cerca de R$ 15 bilhões com encargos da dívida ao longo de 2009.
O valor corresponde a aproximadamente 10% dos gastos com juros da dívida pública no ano passado e deverá acontecer caso a Selic, hoje em 11,25% ao ano, caia para 9,5% ao ano até dezembro. Essa economia ameniza os impactos da crise econômica sobre os indicadores fiscais do país.
O secretário do Tesouro, Arno Augustin, não vê a deterioração das contas públicas como uma notícia negativa. Ao contrário. Ele disse que o resultado é consequência de uma política "anticíclica", de combate à crise. "Neste momento, o impacto na economia da queda da arrecadação e do aumento de despesa é positivo", disse.

Gastos com funcionalismo
Os gastos com os salários do funcionalismo público somaram R$ 27,6 bilhões no primeiro bimestre, alta de 25% em relação ao mesmo período do ano passado. Entre todas as despesas do governo, foi a que mais cresceu. Os investimentos foram de R$ 2,7 bilhões nos primeiros dois meses do ano, 14% a mais que em 2008.
As despesas totais do governo central somaram R$ 86,7 bilhões no primeiro bimestre, 20% maiores que no mesmo período do ano passado. A receita líquida (já descontadas as restituições e incentivos fiscais) tiveram uma queda de 4%, para R$ 89,7 bilhões.
Embora a legislação não permita que o dinheiro que deixa de ser gasto pelo governo com juros seja realocado diretamente para outras despesas, a queda na Selic ajuda a reduzir a dívida pública, o que, em tese, permite que o ajuste fiscal seja menos intenso, sobrando recursos para gastar.
O economista Francisco Lopreato, professor da Unicamp, afirma que a queda na Selic é uma das principais medidas a serem tomadas para ajudar a amenizar os impactos da crise, justamente por permitir que recursos antes usados no pagamento de encargos da dívida possam financiar investimentos públicos sem prejudicar o equilíbrio fiscal.
"A excepcionalidade deste ano mais do que justifica [um aumento nos gastos públicos], pois haverá uma compensação por conta do menor gasto com serviço da dívida pública", disse. Para ele, os incentivos fiscais anunciados até agora pelo governo federal foram "tímidos" e mostram que, mesmo com a crise, a equipe econômica não dá sinais de que vai abandonar o conservadorismo de sua política fiscal.
A economista-chefe do banco ING, Zeina Latif, também afirma que, mesmo com a queda na arrecadação, o mais provável é que a meta de 3,8% do PIB para o superávit primário continue sendo perseguida. "Já se observa uma trajetória ruim para a política fiscal, mas numa velocidade que não gera preocupações para o mercado. Nota-se que existe um certo pragmatismo no governo."
A relativa estabilidade da relação entre a dívida pública e o PIB é um dos fatores que ajudam a diminuir as preocupações com a situação fiscal do país. Entre janeiro e fevereiro, essa proporção passou de 36,9% para 37,0%. Há dois anos, estava em 43,7%.


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