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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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DE MALAS PRONTAS

Para americano, empresas estão no limite

Abandonar o país já é uma possibilidade

DE WASHINGTON

O vice-presidente da Câmara de Comércio dos EUA, Mark Smith, esteve no Brasil na semana passada para tratar dos interesses de 75 empresas americanas com negócios no pais -entre elas, as 11 pesquisadas pela Folha cujos balanços traçam avaliações pessimistas em relação ao país.
"Vim procurar todo tipo de gente, nos ministérios, no governo e no Congresso para ver o que podemos fazer. Infelizmente, estamos vendo um momento muito negativo, principalmente na área de infra-estrutura", afirma.
"Muitas companhias da área estão no limite de abandonar suas atividades no Brasil."
Smith esteve no Brasil com 15 empresários e nove congressistas norte-americanos. Leia a entrevista que concedeu, de Brasília, à Folha:
(FERNANDO CANZIAN)
 

Folha - A safra de balanços do primeiro trimestre das empresas americanas com investimentos no Brasil revela um quadro bem negativo. O que vai mal?
Mark Smith -
O Brasil está indo muito devagar. Há uma série de fatores e incertezas. A taxa de crescimento está muito baixa, os juros, muito altos, e a flutuação no câmbio prejudica muito. Nossos resultados são muito pequenos quando o valor das operações em reais são convertidos para dólares
Ainda há um interesse em relação ao Brasil, mas a tendência de aumento de investimentos caiu muito nos dois últimos anos. Agora, infelizmente, o que estamos vendo é um momento muito negativo, principalmente na área de infra-estrutura. Bilhões de dólares estão deixando de vir para o Brasil e isso não é bom.

Folha - Muita gente diz, no entanto, que há uma mudança positiva na percepção em relação ao Brasil. Não melhorou?
Smith -
Apesar de o Brasil estar caminhando em um trajetória positiva em termos macroeconômicos, ainda há muito trabalho a ser feito. O Brasil perdeu muito terreno no ano passado. Estamos olhando para o país agora no mesmo ponto em que estávamos antes das eleições.
Quando você tem uma moeda perdendo 40% de seu valor em um ano e o risco-país explodindo de 800 para 2.300 pontos, não podemos chamar isso de ambiente estável ou mesmo sustentável.
O Brasil precisa acabar com esses ciclos de altos e baixos. Eles não ajudam em nada a criar um ambiente onde o investidor saiba o que vai acontecer para poder colocar o dinheiro no país.

Folha - No caso das empresas, quais os problemas específicos?
Smith -
Existem enormes incertezas em relação aos negócios de várias companhias em muitos setores. A Monsanto, por exemplo, não tem segurança de como a questão dos produtos geneticamente modificados será tratada no Brasil. A AT&T está fechando suas operações por uma série de razões. A Bellsouth teve inúmeros problemas regulatórios não-resolvidos e dificuldades com seus parceiros no Brasil. Outros perderam muito dinheiro no Brasil. Seus negócios aqui estão seriamente ameaçados.
Se você olhar para o setor energético, ainda não houve uma recuperação das perdas impostas pelo racionamento de energia em 2001. Em toda a área de infra-estrutura, as companhias americanas estão perdendo uma quantidade monumental de dinheiro.
No setor de consumo em geral, tivemos períodos muito difíceis e estamos só estamos começando, ainda muito lentamente, a ver as coisas melhorarem um pouco. O que você viu nos balanços das empresas reflete simplesmente essas dificuldades que mencionei.

Folha - Muitas empresas migraram para a exportação. Não está funcionando?
Smith -
Nos últimos meses, os grandes investidores que temos aqui de fato transferiram parte de suas operações para a exportação. Mas, ironicamente, o crescimento relacionado às vendas externas agora está se tornando um novo desafio por causa da apreciação do real. Estamos vendo as coisas ficarem mais difíceis de novo.
A volatilidade no câmbio hoje é imensa e qualquer planejamento fica totalmente prejudicado. Tenho ouvido de uma série de empresas que exportam de telefones celulares e carros a aparelhos de ar-condicionado e microondas que suas operações estão agora em perigo por causa da apreciação do real.

Folha - O Brasil precisa de novos investimentos para crescer sem inflação e para continuar exportando. Vamos ter?
Smith -
Depende muito de cada setor. Nas áreas mais orientadas ao consumo é possível que haja um aumento. Mas isso só vai ocorrer a partir do momento em que a economia realmente se estabilizar e começar a crescer.
No setor de infra-estrutura, principalmente nos segmentos de energia elétrica e telefonia, enquanto não tivermos regras claras e novos modelos regulatórios, não haverá nenhum novo investimento.
Pior. Muitas dessas companhias estão na verdade no limite de abandonarem as suas atividades no país dependendo das decisões que venham a ser tomadas pelo governo.


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