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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O jogo do mico-preto
Os veteranos do mercado
já começam a se perguntar
até quando vai durar a
festa dos investidores
AS BOLSAS de Valores espalhadas pelo mundo batem sucessivos recordes de alta. Mesmo
nos Estados Unidos, o mais importante mercado, os índices já estão
acima do recorde atingido em 2000,
apesar de a economia passar por um
momento de crescimento bastante
frágil. Uma das forças por trás do vigor dos índices americanos tem sido
uma nova onda de compra de empresas, com o pagamento de grandes
prêmios sobre os preços negociados
nos mercados de ações. Esse mesmo
fenômeno ocorre também nas principais Bolsas européias, como mostra a incrível batalha de bilhões de
dólares pelo banco holandês ABN.
Podemos identificar as forças que
estão por trás desse boom nos mercados de ações. O primeiro é que vivemos, com exceção dos Estados
Unidos, um momento quase mágico
nas maiores economias do mundo:
crescimento econômico acelerado e
inflação sob controle. Em segundo
lugar, as empresas têm apresentado
resultados operacionais bastante
fortes, fazendo com que a relação
preço/lucro ainda se mantenha
abaixo das médias históricas.
Mas o fator mais importante para
esse estado de graça dos mercados
tem sido a incrível liquidez que existe hoje no mundo. O dinheiro está
queimando nas mãos dos investidores, principalmente os grandes fundos de investimento espalhados pelo mundo. Na maioria dos casos, as
transações são pagas em dinheiro,
ao contrário da onda dos anos 90,
quando eram feitas trocas de ações.
E esse dinheiro tem sido obtido cada
vez mais por meio de endividamento. Como exemplo, tenho citado o
caso de uma das últimas operações
de compra de empresas com um
prêmio elevado em relação ao preço
de suas ações no mercado. A partir
desse fato real, crio uma fantasia para mostrar essa armadilha de liquidez que vivemos hoje.
Há questão de poucos meses, uma
empresa americana especializada
em compra de empresas -usando
dinheiro emprestado- pagou algo
como US$ 44 bilhões por uma companhia texana de energia elétrica.
Esse preço representou um prêmio
de 15% sobre o valor de mercado nos
dias que antecederam essa operação. Esse é um fato conhecido por
quem acompanha os mercados.
Agora começo minha imagem sobre
o que aconteceu com os investidores
que venderam suas ações.
A operação certamente foi comemorada com festas e muita alegria
pelos vendedores. Mas, com o passar dos dias, esse sentimento de euforia começou a azedar. Com o dinheiro da venda no caixa e aplicado
em renda fixa a juros baixos, a sensação do bom negócio foi desaparecendo diante da pergunta que começou a ser feita por todos. O que fazer
agora com esse dinheiro todo se o
mercado de ações continua a subir?
De repente, o vencedor dessa operação passou a ser claramente o comprador, que, apesar de endividado,
recebe os bons resultados econômicos da empresa. E aos vendedores
sobrou a conclusão de que a melhor
coisa a fazer era voltar ao mercado
acionário.
Essa espécie de jogo do mico-preto -agora representado por dinheiro em caixa- é que está dominando
a ação dos investidores e criando
uma corrida perigosa em busca de
ativos reais que rendam mais do que
os juros pagos pelos tomadores de
dinheiro nos mercados de crédito,
inclusive no Brasil. Em parte esse é
um movimento lastreado em fundamentos sólidos -a incrível criação
de riqueza proporcionada pela incorporação de centenas de milhões
de pessoas na força de trabalho
mundial-, mas os veteranos do
mercado já começam a se perguntar
até quando vai durar a festa.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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