São Paulo, domingo, 01 de junho de 2008

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ARMANDO CASTELAR PINHEIRO

Operação Nossa Caixa/BB


A proposta de aquisição da Nossa Caixa pelo BB faz sentido, pois ela vale mais para o banco federal do que para SP

A ALTA inflação nos legou um setor financeiro inchado, mas tímido ao financiar a atividade econômica. Desde 1994, porém, o setor ficou mais eficiente, sólido e voltado para o crédito; paralelamente, consolidou-se, saindo de 279 bancos em 1993 para 176 em 2007. Em razão da sua má situação financeira, os bancos públicos ficaram ausentes desse processo de consolidação, que, ao contrário do que se temia, deu-se sem que as instituições estrangeiras se tornassem dominantes, como no México e na Argentina, já que os grandes bancos privados nacionais também cresceram. Em especial, estes lideraram a compra de bancos estaduais vendidos após seu saneamento pelo governo federal.
Depois de suspensa por alguns anos, a venda desses bancos foi retomada com a alienação do Banco do Estado do Ceará (federalizado em 1999) para o Bradesco, em 2005, e a prometida incorporação dos bancos de Santa Catarina, Piauí e Brasília pelo Banco do Brasil. Esta última marca uma nova fase na consolidação do setor, com o BB buscando manter sua liderança por meio de aquisições. Isso reflete, de um lado, uma nova posição política sobre o papel dos bancos públicos, mas também a recuperação da saúde financeira do BB, após seu saneamento e as reformas na sua governança corporativa.
A proposta de aquisição da Nossa Caixa pelo BB é o mais recente capítulo nesse processo. Ela faz sentido? Sim, pois a Nossa Caixa vale mais para o BB -e também para o Bradesco, para o Itaú etc.- do que para o governo de São Paulo, já que sua rentabilidade é inferior à desses bancos. Desse prisma, restaria "apenas" decidir como repartir o ganho daí resultante entre comprador e vendedor. Será que, para isso, é melhor, do ponto de vista econômico (há também questões políticas e jurídicas envolvidas), vender a Nossa Caixa diretamente para o BB ou realizar um leilão? Cabe mais de uma resposta a essa pergunta.
A rede de 559 agências da Nossa Caixa (552 no Estado) é mais complementar e valiosa para o BB, que tem 682 agências em São Paulo, a maioria em torno da capital, contra 1.022 do Bradesco e 814 do Itaú. Por outro lado, o BB tem menor taxa de retorno que os bancos privados e, por esse ângulo, a Nossa Caixa valeria mais para estes. Qual o fator mais importante? Só um leilão poderia dizer.
Faz sentido privilegiar o BB como uma medida de política pública? Os bancos públicos são em geral vistos como instrumentos voltados para facilitar o acesso ao sistema de pagamentos, dar segurança aos poupadores para colocar seus recursos nos bancos; emprestar para atividades pouco rentáveis de uma ótica privada, mas interessantes do ponto de vista social; e promover a competição. Nada disso é relevante na operação de alienação da Nossa Caixa.
O elemento decisivo é, portanto, a exclusividade dada ao BB para ficar com os R$ 15 bilhões de depósitos judiciais da Nossa Caixa. Esses depósitos rendem o mesmo que a poupança (TR mais 6% ao ano, atualmente 7,4%, contra um juro médio cobrado pelos bancos de 37,4% ao ano) sem sofrer as mesmas restrições de aplicação. É um elevado subsídio, que explica grande parte do valor da Nossa Caixa.
A principal lição desse episódio, portanto, é como a concessão de subsídios dissociada de qualquer contrapartida social objetiva reduz a eficiência econômica. O melhor a fazer, no caso, é passar a remunerar os depósitos judiciais pela Selic, no mínimo, leiloando-os para quem pagar melhor. De quebra, iria se reduzir o abuso no recurso ao Judiciário. Outra lição é o ganho de transparência para a sociedade ao ter os bancos públicos listados no Novo Mercado, caso do BB e da Nossa Caixa.


ARMANDO CASTELAR PINHEIRO , 52, analista da Gávea Investimentos, é professor do IE/UFRJ.

Excepcionalmente, hoje, a coluna de JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN não é publicada.



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