São Paulo, domingo, 01 de junho de 2008

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Antônio Ermírio, 80, faz investimento de R$ 1,5 bi

Na semana do 80º aniversário do empresário, CBA recebe aporte bilionário

Livro comemorativo traz depoimentos de políticos e personalidades como o presidente Lula, FHC, Serra e o cantor Roberto Carlos


GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

Na semana em que completa 80 anos, na próxima quarta-feira, o empresário Antônio Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim, prepara-se para iniciar o maior investimento da história da CBA (Companhia Brasileira de Alumínio), a sua menina-dos-olhos -aproximadamente R$ 1,5 bilhão.
Nacionalista, crítico contumaz dos juros altos e dos ganhos que essa política proporciona ao sistema financeiro -apesar de o seu próprio grupo ser dono de um dos bancos mais rentáveis-, Antônio Ermírio comanda um conglomerado que se espalha pelos setores de cimento, financeiro, metalurgia e papel e celulose.
Sua história se confunde com a da própria indústria. No mesmo 4 de junho de 1928, data de nascimento do empresário, o jornal "Folha da Manhã", que originou a Folha, estampava na primeira página a criação do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo, o embrião da Fiesp. O pai de Antônio Ermírio, o senador José Ermírio de Moraes, fez parte da primeira diretoria.
Comemorando seu 80º aniversário, o empresário, colunista da Folha, recebe de presente do ex-secretário de Educação de São Paulo Gabriel Chalita e do economista e amigo José Pastore um livro com o depoimentos de 80 pessoas. Entre elas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o governador José Serra e empresários como Jorge Gerdau Johannpeter, Olavo Setubal e Lázaro Brandão, além de familiares e personalidades como o cantor Roberto Carlos, que apoiou sua candidatura ao governo de São Paulo, nos anos 1980.
Casado com dona Maria Regina há 55 anos, nove filhos (cinco homens e quatro mulheres) e 26 netos, a mais nova, Laura, nascida em janeiro, Antônio Ermírio não preparou nenhuma festa para comemorar seu aniversário. O vigor já não é o mesmo de tempos atrás, quando festejava a data com um churrasco na sede da CBA.
Nos últimos 60 anos, manteve uma rotina incansável. Levanta bem cedo, por volta das 5h, lê os jornais e vai para o escritório às 7h30, seja na Votorantim, que faz 90 anos neste ano, ou no Hospital Beneficência Portuguesa, que preside há 40 anos. A jornada de trabalho vai sempre até tarde.
Avesso a badalações e ostentações, Antônio Ermírio é dono de hábitos simples. Durante muitos anos, dirigiu seu próprio carro e caminhou pelas ruas do centro de São Paulo sem seguranças.
Um de seus melhores amigos, Pastore lembra que, certa vez, quando os dois voltavam a pé do restaurante Cad'Oro, onde Antônio Ermírio almoça com freqüência, para o escritório da Votorantim, o empresário foi parado por um fotógrafo. Incrédulo, indagou: "O senhor não é o empresário Antônio Ermírio de Moraes?". A resposta foi surpreendente: "Você está louco, rapaz. Se eu fosse o Antônio Ermírio, você acha que eu estaria andando pelas ruas de São Paulo sem segurança?". O rapaz seguiu caminho sem fazer a foto.

Política
A política sempre está muito presente na sua vida. Apoiou a abertura do regime militar, iniciada no governo Geisel, e foi um dos empresários que assinaram, em 1978, o "Documento dos Oito", que pedia o fim do regime militar e a volta da democracia. O empresário também se engajou no movimento das Diretas Já.
Em 1986, lançou-se candidato, pelo PTB, à sucessão de Franco Montoro no governo paulista. Foi derrotado por Orestes Quércia e disse que, pelo menos, tinha vencido Paulo Maluf na disputa.
Nas eleições presidenciais de 2002, não escondeu seu apoio ao então candidato José Serra. Em entrevista concedida à Folha, afirmou que Lula estava longe de ser um estadista. Era uma resposta ao apoio manifestado dias antes pelo colega industrial Eugênio Staub à candidatura do petista.
Nos últimos anos, porém, Antônio Ermírio reviu suas opiniões sobre o presidente. Suas declarações mais recentes têm sido de apoio à condução da economia, e ele considera o governo Lula uma "agradável surpresa".
Outro revés na vida de Antônio Ermírio foi não ter conseguido ganhar o leilão de privatização da Vale, em 1997. Franco favorito, acabou perdendo para o empresário Benjamin Steinbruch, da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional). Fiel ao seu estilo sincero, cumprimentou o vitorioso, mas lembrou que ele ainda não era do ramo.

Bom humor
Quem convive com Antônio Ermírio afirma que ele é muito bem-humorado, apesar de essa não ser uma de suas características mais visíveis. Durante a fracassada campanha ao governo do Estado, seguido por uma tropa de repórteres, encontrou-se coincidentemente com o seu alfaiate. O alfaiate se aproximou de Antônio Ermírio e cobrou o fato de ele só ir ao seu bairro durante a campanha política.
O empresário não teve dúvidas e sacou uma das suas: "Você fica quieto porque senão eu conto para os jornalistas que você é o meu alfaiate".
Todos riram, afinal Antônio Ermírio certamente não figuraria numa lista dos mais bem vestidos do país.
O empresário se orgulha também de nunca tirar férias.
Tanto que, em 1992, aos 64 anos, ele foi capa da Revista da Folha por ter decidido tirar férias, a primeira após 35 anos de trabalho e de sua formação em engenharia no Colorado, nos Estados Unidos.
Ele e dona Maria Regina foram às Montanhas Rochosas, também nos Estados Unidos. Antes, férias, só na lua-de-mel, quando viajou com a mulher para a Europa. Mesmo assim, aproveitou para visitar algumas indústrias.

Bancos
Apesar das críticas de Antônio Ermírio aos bancos, ele é muito amigo de dois dos maiores banqueiros do país: os presidentes do Conselho de Administração do Bradesco, Lázaro Brandão, 81, e do Itaú, Olavo Setubal, 85.
"Mas ele acabou criando um banco e tomou gosto pelo negócio. Aliás, o banco dele é muito competitivo e nos dá muito trabalho", afirma Brandão, que destaca também a dedicação de Antônio Ermírio à área social.
Foi o industrial-banqueiro, por exemplo, que restaurou o Mosteiro de São Bento, no centro de São Paulo.
Após ter lido no jornal sobre as dificuldades da edificação, foi andando até o mosteiro para oferecer ajuda.
Anos depois, o mosteiro hospedou o papa Bento 16 em sua visita ao Brasil. E o papa fez questão de receber Antônio Ermírio e dona Maria Regina para agradecer pela reforma. Disse a Antônio Ermírio que ele já estava com muitos tijolos acumulados no céu.

Teatro
Versátil, o empresário já escreveu três peças de teatro, todas refletindo problemas sociais do Brasil. A primeira, "Brasil S/A", foi uma crítica forte à especulação financeira no país. E nem por isso deixou de convidar seus amigos banqueiros para a estréia.
Depois veio "S.O.S. Brasil", sobre os problemas da saúde no país, que conhece bem por sua atuação na Beneficência Portuguesa, e "Acorda Brasil", que conta a história da criação bem-sucedida de uma orquestra sinfônica na favela de Heliópolis, em São Paulo.
Um traço curioso da personalidade de Antônio Ermírio é o de até hoje cultivar amizades com dois colegas de infância, da época em que cursava o primário no Colégio Rio Branco. São eles o poeta Paulo Bonfim, 81, e o marchand Gérard Loeb, 80, que não têm nada a ver com a sua vida empresarial.
Eles se conhecem há 70 anos, a ponto de os depoimentos dos dois no livro organizado por Chalita terem sido incluídos na parte dos familiares.
Até há pouco tempo, eles mantinham uma relação muito próxima também com dona Soledade, a professora que os alfabetizou. Eles trocavam bilhetes e se encontravam freqüentemente. Há alguns anos, pouco antes de morrer, dona Soledade os chamou para dizer que estava muito preocupada porque a letra deles estava muito feia. Ela queria corrigir a caligrafia dos ex-alunos.
Até hoje, Antônio Ermírio mantém duas metas, uma de aprender e outra de investir, mesmo aos 80 anos.


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