|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Triste fim de Fernando Henrique Cardoso
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
No início do século 20, Lima
Barreto publicou o seu principal romance, "Triste Fim de Policarpo Quaresma". Hoje, alguém
bem que poderia escrever todo
um tratado sobre o "Triste Fim de
Fernando Henrique Cardoso".
A diferença, evidentemente, é
que o personagem de Lima Barreto era um patriota exacerbado.
Fernando Henrique, ao contrário, não tem muita afinidade com
o Brasil. É o típico representante
de uma geração de políticos latino-americanos "globalizados", os
procônsules da "Nova Roma".
Infelizmente, a "Nova Roma"
tem o hábito desagradável de
abandonar os seus procônsules à
própria sorte. Enquanto lhes convém, os EUA usam e abusam de
figuras como Carlos Menem, Alberto Fujimori ou Fernando Henrique Cardoso. Mas não os respeitam. E resolvem, às vezes, tratá-los a pontapés.
O exemplo mais recente desse
comportamento foram as declarações de Paul O'Neill, secretário
do Tesouro dos EUA, que está
com visita marcada ao Brasil.
O'Neill escolheu o pior momento para sinalizar, mais uma vez,
que tem restrições a apoiar financeiramente países como o Brasil e
a Argentina. Em entrevista a um
canal de TV nos EUA, O'Neill observou que o Brasil, a Argentina e
o Uruguai precisam implementar
políticas adequadas e evitar que
os empréstimos externos recebidos "saiam simplesmente do país
para contas bancárias na Suíça".
Questionado se estava indo à
América do Sul com uma oferta
de assistência adicional do FMI, o
secretário respondeu: "Não, não,
não".
Os mercados financeiros entraram imediatamente em pânico.
FHC pediu uma retratação e
ameaçou não receber O'Neill. Depois, deu-se por satisfeito com alguns esclarecimentos e manifestações genéricas de apoio do governo dos EUA.
Uma encenação de quinta categoria. Convenhamos, leitor, desde
quando procônsul pode se recusar
a receber um emissário do Imperador?
Outro aspecto algo ridículo do
episódio foi a virulência da reação de parte da imprensa brasileira. O pessoal perdeu a compostura e passou a insultar o secretário
norte-americano.
Não há dúvida de que O'Neill
poderia medir melhor as suas palavras. Os argentinos têm histórias a contar a esse respeito. Mas,
francamente, por que imaginar
que os EUA teriam, a essa altura,
a obrigação de apoiar um empréstimo do FMI (mais um!) ao
governo FHC? O Brasil recorreu
ao FMI em 1998 e em 2001. Agora
quer outro empréstimo para atravessar 2002 e parte do ano de
2003. Não estamos abusando um
pouco?
A experiência da Argentina em
2001-2002 demonstra de forma
clara que o ambiente em Washington mudou bastante. Tornou-se mais difícil negociar operações de emergência coordenadas pelo FMI. Países como o Brasil, dependentes de capital estrangeiro e financeiramente vulneráveis, atravessarão um período de
grandes dificuldades. Os empréstimos, quando vierem, serão mais
modestos. E as exigências, maiores.
Os jornalistas brasileiros fariam
melhor se reservassem a sua indignação patriótica para o principal responsável pela situação em
que nos encontramos: Fernando
Henrique Cardoso. Afinal, as políticas econômicas adotadas nos
últimos oito anos -sob aplauso,
diga-se, de grande parte dos
meios de comunicação nacionais- é que deixaram o Brasil à
mercê das decisões, humores e
preconceitos de Washington e
Wall Street.
Paulo Nogueira Batista Jr., 47, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV- SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A Economia como Ela é..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
Texto Anterior: Desvalorização se aproxima do peso Próximo Texto: Luís Nassif: Um Banco Central suíço Índice
|