São Paulo, domingo, 01 de novembro de 2009

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ALBERT FISHLOW

Aonde vamos?


Uma lenta recuperação dos EUA, com juro baixo e dólar em queda, parece ser o consenso das projeções para 2010


UM RELATÓRIO favorável sobre o crescimento dos EUA no terceiro trimestre, publicado na semana passada, deixou o mundo inteiro um pouco mais contente. A economia americana cresceu em ritmo anualizado de 3,5% ante o segundo trimestre. Essa é a primeira vez que ocorre um resultado positivo após quatro trimestres de retração. Na comparação com a situação de seis meses atrás, a diferença é de quase dez pontos percentuais positivos. Chegou a hora de comemorar?
Embora os mercados de ações tenham subido 60% nos últimos meses e algumas empresas de Wall Street tenham registrado grandes lucros, restam mais que uns poucos céticos que ainda não se deixam convencer. Até mesmo os otimistas demonstram certa cautela.
Afinal, sem a assistência especial à compra de automóveis e um subsídio para os compradores de primeira casa, nem o consumo nem o investimento residencial teriam demonstrado números tão positivos quanto os que atingiram. Se excluída apenas a produção de automóveis, por exemplo, o ganho se reduz a 1,9%.
A Grande Recessão acabou. Mas o que vem a seguir? O desemprego persistente, que se aproxima dos 10%, é preocupante. As empresas demitiram, na expectativa de defender seus lucros, e obtiveram grandes avanços de produtividade. Isso é uma boa notícia. A má é que milhões perderam o emprego.
Mais cortes podem ocorrer até que as contratações superem as demissões, o que é previsto apenas para o ano que vem. Os novos empregos talvez sejam bastante diferentes dos anteriores. Os candidatos mais velhos a uma vaga, e aqueles que não tiverem completado programas universitários, sofrerão.
O Congresso provavelmente vai prolongar benefícios aos desempregados e deve até manter alguma forma modesta de assistência aos mutuários de imóveis residenciais -além das baixas taxas de juros sobre as hipotecas. Haverá mais uma pequena transferência aos beneficiários da Previdência; o número de idosos que votam supera a proporção dessa faixa etária na população.
Mas não está previsto um segundo grande programa de estímulo. O deficit fiscal de dois dígitos é causa legítima de preocupação. Uma lenta recuperação da economia, com a manutenção de juros menores e o dólar em queda para ajudar as exportações e reduzir as importações, parece ser o consenso das projeções para 2010. Em termos agregados, isso não difere muito do percurso seguido pelos EUA depois de 2000, mas algumas mudanças importantes não devem ser ignoradas.
Os baixos juros reais são uma delas. Um deficit comercial menor, no futuro, é outra, o que tenderá a favorecer o emprego doméstico.
A globalização sobreviverá, sob esse tipo de pressão? Primeiro, houve a séria redução nas oportunidades de comércio internacional resultante do declínio na atividade econômica em todo o mundo, mas especialmente nos países desenvolvidos.
Depois, o desequilíbrio persistente nas taxas de câmbio: ironicamente, um dos países mais beneficiados é a China, devido ao seu forte vínculo com o dólar. Por fim, os fluxos internacionais de capital, um dia tão abundantes, não devem voltar rapidamente aos níveis anteriores. Agora, temos o G20 e um FMI muito mais vigoroso. Todos esses grupos em última análise dependem de um núcleo central muito menor.
De muitas formas, isso se resume ao G20, mas sem o zero no final: o G2, que reúne EUA e China. O presidente Obama visitará a China dentro de duas semanas. Talvez possamos perceber melhor para onde vamos depois daquela visita.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

ALBERT FISHLOW, 73, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna.

afishlow@uol.com.br


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