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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Oposição aos EUA vai marcar primeira década
GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas
Em meio a tantas retrospectivas
e listas com os destaques do século e do milênio, é impressionante
a escassez de prognósticos sobre
os próximos anos.
Talvez seja uma espécie de alívio com a grande crise que (ainda) não veio, alívio que produz
complacência e acomodação.
Mas já há indícios de que a próxima década será marcada por uma
onda sem precedentes de conflitos internacionais, tendo como
pivô uma ampla reação ao domínio econômico e político norte-americano.
Os historiadores do futuro vão
rastrear as origens da desordem
no final dos anos 90: quando alguns diziam que a História terminara e que o capitalismo anglo-saxão era vencedor.
Liberalização
A rejeição às pressões por maior
liberalização econômica, primeiro em telecomunicações, depois
no campo das regras multilaterais
de investimento e, finalmente, no
fracasso do lançamento da Rodada do Milênio, como ficou claro
no último encontro internacional
em Seattle, será vista como sinal
de que nem o mais extremo poder
político, militar e econômico é suficiente para sujeitar o sistema
mundial aos interesses da superpotência.
Nas últimas semanas, alguns
episódios até caricatos deram sabor humano a essa realidade estrutural: houve a Rússia lembrando aos Estados Unidos da existência de um arsenal nuclear rival; a
China deu respaldo ao presidente
russo; e o Japão anunciou mais
um pacote, agora de quase US$ 1
trilhão, para reativar sua economia e seus bancos. O Oriente se
reorganiza.
Rússia, China, União Européia,
Índia, Japão, em cada um desses
centros de poder mundial as manobras de contraponto ao poder
norte-americano são gradualmente desenhadas, apontando
para uma provável aliança antiamericana.
No mundo das idéias, a oposição também vem ganhando força. Termos como globalização, de
longe a palavra mais usada para
fazer referência ao conjunto de
transformações dos últimos 15
anos, estão sendo submetidos a
uma carga de críticas sem precedentes.
Para os mais críticos, tudo não
passa de mais uma fantasia criada
para mascarar o velho imperialismo. E que, como ocorreu com
aquele velho imperialismo, vai
desaguar em mais conflitos entre
os grandes, entre os grandes e os
pequenos e dentro de cada sistema nacional.
Império financeiro
Há também um desconforto cada vez mais amplo com a subordinação da vida econômica ao império das instituições financeiras,
que, atuando num mercado internacionalizado e sincronizado, valorizam e desvalorizam moedas e
países em busca de ganhos de curto prazo.
Ideologicamente, a vítima nos
próximos anos será o neoliberalismo, que virou expressão pejorativa para designar a defesa intransigente do liberalismo, ou seja, da supremacia dos interesses
individuais sobre as necessidades
coletivas, do mercado sobre o Estado, da liberdade empresarial sobre o controle social, estatal ou
mundial sobre as atividades empresariais.
Na superfície tudo parece equilibrado, como se o sistema econômico mundial estivesse às vésperas de uma nova fase de expansão.
É difícil evitar a comparação com
a euforia causada pelo excesso de
bebida ou narcóticos.
Pois é exatamente no momento
em que a hegemonia dos EUA e
do modelo liberal mais parece insuperável que se acumulam, em
todo o mundo, evidências de que
muita coisa continua fora da ordem na "nova ordem mundial".
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