São Paulo, segunda-feira, 02 de fevereiro de 2009

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Plano de megafraude na Bolsa londrina foi preparado em SP

Documentos "provavelmente falsos" do BB foram utilizados para atrair investidores; relatório não comprova participação de servidor do banco estatal

ALAN GRIPP
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Parte significativa da megafraude de US$ 600 milhões na Bolsa de Londres (que voltou à tona na semana passada com a prisão de seis suspeitos) foi arquitetada em São Paulo, revela relatório confidencial do Escritório de Fraudes Graves do Reino Unido, obtido pela Folha.
Por meio de documentos "provavelmente falsos" do Banco do Brasil, que chegaram a ser autenticados em cartório de São Paulo, a gestora de investimentos Langbar International Limited simulou depósitos milionários na instituição estatal, usados para catapultar as ações da empresa no mercado financeiro londrino.
Com o auxílio do Ministério da Justiça brasileiro, os investigadores britânicos reconstituíram os passos de três executivos da Langbar em São Paulo e levantaram a hipótese de participação de funcionários do Banco do Brasil na elaboração da papelada, que permitiu à empresa lucrar mais de US$ 66 milhões em poucos dias.
Apesar das suspeitas, os documentos a que a Folha teve acesso não comprovam a participação de servidores do banco nas fraudes. Na última quarta-feira, seis acusados foram presos na Espanha -cinco espanhóis e um argentino. A investigação continua.
No Brasil, os agentes britânicos apreenderam documentos bancários e correspondências supostamente trocadas entre servidores do banco e executivos da Langbar. Também foram tomados depoimentos de funcionários de primeiro escalão do BB, que identificaram traços de fraude nos papéis da empresa -hipótese abraçada pelo órgão do Reino Unido.
O esquema foi descoberto em outubro de 2005, quando a Langbar reconheceu a autoridades monetárias britânicas que não tinha condições de confirmar a existência dos US$ 521 milhões que estariam depositados no ABN Amro, na Holanda, e no Banco do Brasil.
Poucos meses antes, a Langbar publicou dez anúncios em jornais do Reino Unido divulgando a existência de CDIs (Certificados de Depósito Interbancário) que teriam sido emitidos pelo BB, no valor total de US$ 659 milhões.
A publicidade tinha o objetivo de gerar interesse pelas ações da Langbar, mas o apetite demonstrado pela empresa também chamou a atenção dos investigadores. Num dos comunicados, ela chegou a anunciar que negociava participação no setor de petróleo e gás da Rússia e em contratos na área de defesa e farmacêutica.
Segundo o relatório da investigação, os negócios da Langbar estavam adormecidos até julho de 2005, quando entrou em cena um novo executivo da gestora de investimento, Stuart Geoffrey Pearson. Naquele mês, ele esteve em São Paulo ao lado de Abraham Arad Hochman, empresário israelense naturalizado argentino, preso na semana passada acusado de ser o mentor intelectual das fraudes. Na viagem, segundo os investigadores, foi executada a parte principal do plano.
Em depoimento à Scotland Yard, Pearson disse ter se encontrado com Hochman no saguão do Hotel Intercontinental, onde ficou hospedado. De lá, os dois seguiram para o que ele "supunha ser a sede do Banco do Brasil" em São Paulo, onde foram recebidos por um suposto funcionário, que lhe entregou até um cartão de visitas.
O funcionário, de acordo com Pearson, lhe entregou os CDIs confirmando os depósitos milionários. Os documentos foram levados a um cartório para reconhecimento de firma. O executivo disse ter recebido de Hochman documentos que o alçavam à condição de signatário de duas contas bancárias no BB ao lado do suíço Jean-Pierre Regli. Regli, segundo a Polícia Federal, esteve dois meses antes em São Paulo.
O Escritório de Fraudes Graves afirma acreditar que Pearson, mesmo tendo sido contratado como executivo da empresa, foi vítima de um engenhoso e cinematográfico golpe.
"As explicações apresentadas pelo sr. Pearson levantam a suspeita de [ele] ter sido vítima de uma complexa fraude em São Paulo (...), quando foi levado a uma filial do Banco do Brasil e lá apresentado a um indivíduo que fingiu ser funcionário do banco", afirma o documento do organismo.
Para ter uma ideia, um dos CDIs apreendidos, de US$ 275 milhões, tinha a assinatura do então presidente do BB, Cássio Casseb Lima. O escritório de fraudes do Reino Unido considera o documento forjado.


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