São Paulo, sexta-feira, 02 de março de 2007

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

O que o PIB de 2006 nos mostra

A informação mais importante nos números do PIB é que a carga tributária aumentou mais uma vez

A DIVULGAÇÃO, pelo IBGE, dos números sobre o PIB de 2006 é uma oportunidade muito rica para olharmos com profundidade para a economia brasileira. É impossível, na era da nossa sociedade midiática, fugir da avaliação superficial que temos hoje na imprensa. O crescimento de 2,9% no último ano do primeiro mandato de Lula, e que será o centro das notícias e opiniões nos próximos dias, é o que menos importa no relatório do IBGE. Outra parte dominante das discussões é a clivagem -bom ou ruim- sobre nossa economia no ano passado. A imagem que passaria ao meu leitor é a de um copo meio cheio, meio vazio. Ela acomoda otimistas e pessimistas ao mesmo tempo.
Portanto minhas reflexões de hoje pretendem fugir desse lugar-comum e trazer alguns comentários que auxiliem na compreensão, com mais profundidade, de como anda o pulsar de nossa economia.
Nesse sentido, a informação mais importante nos números divulgados é a de que a carga tributária aumentou mais uma vez.
O IBGE divulga dois números relativos ao crescimento em 2006: preços sem impostos e com impostos. No primeiro caso, o PIB cresceu 2,7%, e, no segundo, 2,9%. Ou seja, a parcela do governo no bolo da economia cresceu novamente em 2006. Essa mesma informação, captada por uma instituição privada, está também na imprensa. Segundo o IBPT, os números do IBGE mostram que a carga tributária no Brasil passou, entre 2005 e 2006, de 37,8% para 38,8% do PIB.
Explico por que, para mim, essa é a informação mais importante e a mais negativa nos números divulgados. A carga tributária e o volume de gastos do governo obrigam o Brasil a ter o sistema tributário mais irracional e antimercado entre as nações do mundo emergente. É esse aleijão o maior limitador para que possamos crescer como nossos competidores. Por isso, a informação que tanto o volume de impostos pagos como o de gastos do governo aumentou mais uma vez assume esse papel tão importante. Se isso é correto, estamos aumentando as restrições ao nosso crescimento mais vigoroso.
Outra informação negativa em relação ao crescimento é que o vazamento para fora da demanda interna está se acelerando e chegou a 1,4% do PIB no ano. Colocado em um gráfico trimestral, o crescimento desse vazamento é monotônico, embora os dados de janeiro já disponíveis mostrem uma pequena desaceleração. É evidente que a contrapartida disso é a expansão acelerada do consumo e do investimento, com crescimento de 3,8% e 6,3%, respectivamente. O consumo aparente de máquinas e equipamentos cresceu a taxas superiores a 9%.
Esse é um sinal claro de que os investimentos em capacidade produtiva estão em progressão, principalmente nos setores que estão se beneficiando do cenário externo favorável e do aumento sustentado do consumo das famílias.
Mas há o outro lado, que é a incapacidade da oferta local de acompanhar esse crescimento, que nos remete novamente à questão fiscal e do ambiente de negócios hostil.
Não é por outra razão que a indústria de transformação, nos números do IBGE, cresceu apenas 1,9% em 2006. Já a indústria extrativa mineral, que está se beneficiando de um impressionante aumento de preços internacionais, cresceu sua produção em 5,6%.
A questão do aumento significativo do coeficiente de importações, principalmente na indústria manufatureira, e seus efeitos sobre a produção passaram a ser um item importante do debate econômico, o que acho muito bom. Nesse sentido, duas estatísticas recém-divulgadas devem jogar mais lenha na fogueira: os dados de fevereiro mostram que o saldo de nosso comércio exterior está acelerando novamente para algo como US$ 47 bilhões anuais, bem acima das projeções para este ano; e as compras de dólar pelo Banco Central continuaram mesmo durante a crise dos últimos dias, levando nossas reservas para mais de US$ 101 bilhões.
Outro dado que precisa ser acompanhado com cuidado é o comportamento dos estoques do setor produtivo. No último trimestre de 2006, houve um aumento importante, que adicionou 0,5% ao crescimento do PIB no período.
Não procede, portanto, a teoria de que os estoques estavam contribuindo negativamente para com o crescimento.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br


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