São Paulo, sexta-feira, 02 de março de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

Quem pisca primeiro vende

Aversão a risco sobe; reações dos mercados a indicadores pontuais são histéricas, mas esta "virada" vai durar?

A MENOR das incertezas desses dias de balas perdidas financeiras é que o custo de fazer seguro financeiro e investimentos de risco subiu. Outro indicador relevante, mais subterrâneo e incerto, é que, em relação à semana passada, as operações com derivativos triplicaram nos Estados Unidos e na Europa rica, segundo estimativas de bancões europeus. Por fim, tem mais gente procurando títulos de governos de países ricos e seguros.
Isto é, primeiro subiu o custo de fazer operações financeiras que protegem credores e investidores de calotes. Ficou mais caro proteger investimentos em mercados arriscados (como aqueles em títulos de empresas ou países que não estão nas melhores categorias de crédito). Os indicadores de volatilidade dispararam. Mais volatilidade (variação) de preço de ativos financeiros, mais risco; risco maior encarece o crédito.
Segundo, estimam bancos europeus, aparentemente grandes fundos de investimento estão refazendo suas carteiras, digamos, de aplicações e apostas malucas e complexas em mercados inseguros. Terceiro, como sói acontecer em momentos de estresse financeiro, o dinheiro grosso procura aplicações mais seguras, e aumentou a procurar por papéis como títulos do Tesouro americano.
Em resumo, parece que começou um processo de desmanche da fé doida de que a volatilidade seria permanentemente baixa e de que os retornos de ativos de risco seriam constantemente altos. E daí? Daí que o custo de alavancar empréstimos para fusões e aquisições deve aumentar. Daí que o custo de investir em papéis como os brasileiros tende a aumentar. Isso é sinal de virada duradoura nos mercados financeiros mundiais? Se alguém soubesse a resposta, não a diria nem a venderia -aproveitaria a informação para fazer dinheiro.
Quanto à variação dos preços de ativos como ações, a mais recente impressão que fica depois de ler ou ouvir relatos de estrategistas de bancões como Morgan Stanley ou Dresdner é que os investidores estão à espreita de quem pisca primeiro: se você vender (e derrubar os preços), eu também vendo.
O nervosismo pode se ver medido pelas reações exageradas à divulgação de indicadores econômicos que, faz uma semana, provocariam variações de um par de décimos ou de centésimos de porcentagem nas Bolsas americanas.
Considere-se, por exemplo, o efeito do indicador de encomendas de bens duráveis para a indústria (de anteontem, que fez muito estrago) ou o de atividade das fábricas (de ontem, que tirou a Bolsa de Nova York do mergulho matinal no medo).
Decerto há sinais de fumaça escura em mercados importantes nos Estados Unidos, como o crescente número de calotes de empréstimos imobiliários e a queda dos preços e das vendas de casas. Mas não há quem saiba prever o impacto disso nas finanças americanas.
Sabe-se apenas que, assim como um dia as crianças acabam por descobrir que a morte existe, os mercados acostumados a cinco anos de bonança perceberam que o risco de prejuízo abrupto e grande não desapareceu. Mas daí a deduzir que virá tragédia financeira e econômica vai ainda muito chão.


vinit@uol.com.br

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