São Paulo, sexta-feira, 02 de março de 2007

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Bevilaqua deixa diretoria do Banco Central

Considerado o mais conservador da instituição, diretor diz que sai por "motivos pessoais'; Meirelles afirma que política não muda

Mário Mesquita, diretor de Estudos Especiais, acumulará as duas funções por tempo indeterminado; Bevilaqua poderá participar do Copom


SHEILA D'AMORIM
NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um dia após o governo anunciar que a economia cresceu apenas 2,9% em 2006, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Afonso Bevilaqua, símbolo do conservadorismo e da política de juros altos da instituição, pediu demissão.
Oficialmente, ele e o presidente do BC, Henrique Meirelles, alegaram que o motivo foi pessoal. Depois de quase quatro anos no cargo, Bevilaqua disse que queria ficar mais tempo com a família.
Mas a saída do diretor -que será substituído por tempo indeterminado pelo atual diretor de Estudos Especiais, Mário Mesquita- é marcada por um longo processo de desgaste e pressão política sobre o BC.
Desde que assumiu o cargo, em julho de 2003, Bevilaqua chegou a pedir demissão duas vezes em meio ao tiroteio de petistas, governistas e da oposição contra o BC. Em todas, foi convencido a ficar no cargo diante do agravamento da crise política, envolvendo o primeiro escalão do governo, entre eles o próprio Meirelles e o ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda).
No fim de 2006, ele já havia dito a Meirelles que não deveria ficar no segundo mandato e que estava sendo cotado para ser o representante do Brasil no FMI. Foi atropelado, na semana passada, pela indicação do economista Paulo Nogueira Batista Jr., seu desafeto e amigo do ministro Guido Mantega (Fazenda), que trava guerra velada com o presidente do BC.
Ontem, Bevilaqua negou que a nomeação de Batista Jr. tenha pesado na sua decisão. O próprio diretor, porém, assim como Meirelles, também vinham afirmando que qualquer mudança na diretoria só seria efetuada depois que o presidente Lula confirmasse o nome da pessoa que comandaria o BC no segundo mandato -o que ainda não ocorreu oficialmente.
"Isso não era um assunto para, depois de tomada a decisão, aguardar para anunciá-la", tentou justificar Meirelles. Segundo ele, Bevilaqua o procurou, ontem, para informá-lo de seu desejo de deixar o cargo. "Bevilaqua pediu para antecipar sua saída. Achei razoável por questões pessoais, familiares."
Decidida a troca, Meirelles disse que informou Lula e Mantega.
O presidente do BC também se esforçou para reiterar que a condução da política de juros não sofrerá mudanças com a saída de Bevilaqua e que não teme sucedê-lo como maior alvo do fogo amigo. "Ele [fogo amigo] nunca me abandonou", disse, referindo-se às críticas do próprio governo à ação do BC.
"A política do BC não é de um ou outro diretor. As decisões do Copom [Comitê de Política Monetária do BC] são colegiadas e tomadas de acordo com procedimentos técnicos."
Apesar da pressa do diretor em deixar o BC, Meirelles e Bevilaqua se enrolaram quando questionados se o diretor participaria da próxima reunião do Copom, na terça e na quarta.
"Vamos ver", disse Meirelles, destacando que precisa de "um período de transição". Isso apesar de o substituto dele já ser diretor do BC desde junho e de suas atividades estarem relacionadas à área de Bevilaqua.
Em seguida, diante da insistência dos jornalistas, emendou: "A princípio deve participar [do Copom]. Tudo indica que sim".
Meirelles afirmou ainda que vê com normalidade as críticas à política de juros. A equipe dele é apontada por representantes do próprio governo como o responsável pelo baixo crescimento da economia.
"É normal o debate sobre política econômica, principalmente num país com um histórico de inflação alta como o Brasil e que não está acostumado com uma política monetária de sucesso que estamos implementando", argumentou.
Bevilaqua não deu detalhes sobre o que o levou a pedir demissão e não disse o que fará após formalizar a saída e cumprir a "quarentena" de quatro meses, em que estará impedido de trabalhar no setor privado.


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