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Em meio à crise, real atinge maior valor
Trazido à cotação presente, dólar de antes da maxidesvalorização de 1999 valeria R$ 2,28, diz estudo; hoje está abaixo de R$ 1,70
Para economistas, câmbio
não deflagra crise porque a
economia está mais forte e
subiram preços e volumes
das exportações brasileiras
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil da moeda forte do final dos anos 90, em que a classe
média teve acesso a produtos
importados, viagens e estudos
no exterior, está de volta. Estudo da consultoria Economática
mostra que, mesmo em meio à
crise nos mercados, o dólar a
R$ 1,67 chegou a seu menor valor real (descontada a inflação
pelo IPCA) desde janeiro de
1980 -equivale a dizer que a
moeda brasileira está no maior
valor em quase 30 anos.
Toda vez que isso acontecia
na história brasileira o país estava às portas de uma crise
cambial, em que o governo era
obrigado a recorrer a uma desvalorização para fazer caixa
com exportações. A última crise do tipo foi em 1998, época do
câmbio fixo. Culminou na maxidesvalorização de 8,3% do
real, em 13 de janeiro de 1999.
O dólar já está hoje em um
valor real mais baixo do que antes dessa máxi. Trazido a valor
atual, o R$ 1,12 do câmbio fixo
valeria R$ 2,28. Do lado oposto,
o maior valor atingido pelo dólar foi em 27 de junho de 1985
(governo Sarney), quando a
moeda era o cruzeiro e a inflação chegava a 30% ao mês. Em
valores atuais, o dólar estaria a
R$ 7,43 -e a moeda brasileira
em US$ 0,13. Anteontem, chegou a US$ 0,591 por real e na
quinta, a US$ 0,598.
No estudo, a Economática
trouxe o dólar a valor presente
em seis moedas, pela ordem
cronológica: cruzeiro, cruzado,
cruzado novo, cruzeiro (novamente), cruzeiro real e real. O
levantamento começa em 1980,
o primeiro ano cheio do IPCA.
A novidade é que a valorização da moeda brasileira acontece fora de um cenário de crise.
O que mudou? O dólar perdeu
valor internacional. O mundo
cresceu e a economia brasileira
se fortaleceu, na avaliação de
economistas ortodoxos e heterodoxos, de diferentes linhas
políticas. A primeira mudança
foi o câmbio flutuante, que
amortece as oscilações.
"As maxidesvalorizações
ocorreram sempre em regime
de câmbio fixo", disse o ex-ministro Mailson da Nóbrega, que
fez uma máxi em 1989.
"Se secar o fluxo de capitais,
naturalmente o câmbio se desvaloriza e reequilibra via comércio", disse Luiz Fernando
Figueiredo, ex-diretor do BC
que enfrentou a crise de 2002.
"Mãozinha de Deus"
O mundo passou a consumir
e a pagar mais por produtos
brasileiros, como commodities.
Também cresceu a liquidez internacional, que liberou dinheiro especulativo e produtivo para buscar maior retorno nos emergentes. Hoje, a diferença entre o juro alto no país e
o baixo lá fora estimula ainda
mais a entrada de capitais.
"Com uma mãozinha de
Deus, aumentaram as exportações e os preços. O Brasil costumava gastar com petróleo, em
momentos de crise, 45% da receita com exportação. Isso mudou. A situação permite fazer
quatro anos de besteira sem nenhuma conseqüência", disse o
ex-ministro Delfim Netto, que
operou máxis nos anos 70.
"Sempre haverá flutuações
do câmbio em razão de crises e
coisas da espécie. Não são as regras que mudam, é o ambiente
econômico. A melhora da economia ocasiona a valorização
cambial", disse Gustavo Franco, ex-presidente do BC à época
do câmbio fixo.
"Voltamos à taxa do Gustavo
Franco. Perdemos o efeito da
máxi de 1999. Mas o Brasil ganhou eficiência, o exportador
aprendeu a usar a taxa a seu favor, aproveitou o juro mais baixo lá fora", disse Emilio Garofalo, ex-diretor do BC em 1991.
Para o presidente da Economática, Fernando Exel, o estudo merece uma ressalva para o
efeito da perda do valor de
compra do dólar. Desde 1980, a
inflação ao consumidor nos
EUA foi de 175%. No Brasil, esse índice foi de 230%.
"A inflação do dólar no mundo inteiro não pode ser muito
diferente, senão geraria oportunidades de arbitragem. Ou
vamos entrar numa nova era,
em que as vantagens da moeda
americana de ser referência internacional se perdem, ou o dólar está mais baixo no Brasil do
que deveria e vai se recuperar."
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