São Paulo, Terça-feira, 02 de Março de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO ECONÔMICA

Menos 4%, por quê?

BENJAMIN STEINBRUCH

Fico preocupado sempre que leio nos jornais alguém defendendo ou admitindo crescimento negativo para o Brasil. Mais ainda quando é pessoa que admiro e respeito, como é o caso do ministro Pedro Malan. Entendo sua posição como economista respeitado no Brasil e no exterior, mais ainda como bom brasileiro que é. Se fala assim, é porque acredita, o que torna mais importante a afirmação. É por isso que eu gostaria de levantar algumas idéias.
Quando o ministro fala em 4% de crescimento negativo do PIB deste ano, todos pensam que vai ser 8%. Se o governo, que é governo, está pessimista, imagine nós, os cidadãos brasileiros, como vamos estar nos próximos meses. Acredito ser mais do que válida a preocupação do governo com a volta da inflação, e todos os esforços devem ser feitos para impedir a ressurreição inflacionária. Mas partir para solução que implique crescimento negativo de 4% é o mesmo que jogar futebol com 11 goleiros e saber antecipadamente que vai tomar pelo menos seis!
Um país do tamanho do Brasil, com 165 milhões de pessoas, politicamente estruturado, empresarialmente competente, com o sistema financeiro em boa saúde, excelentes profissionais e reconhecidamente com enormes potenciais não pode se acovardar, jogar na retranca para perder de pouco.
Acredito que devemos ousar, ser criativos, convocar os brasileiros para estabilizarmos o país com o crescimento da produção, o retorno de investimentos, a maior geração de empregos, juros menores, impostos menores, desvalorização menor, maior saldo na balança de pagamentos, eventual anistia parcial, retorno do otimismo e crescimento sustentado. Juntar tudo isso é possível? Acredito que sim. Podemos buscar a estabilidade com uma grande recessão ou atingi-la com o crescimento sustentado. São as duas opções sobre a mesa.
No primeiro caso as ferramentas principais são juros altíssimos, carga tributária alta, redução da atividade econômica, desemprego, inadimplência e quebradeira. No segundo caso, carga tributária menor (com todos pagando), juros menores (com todos pagando, até o próprio governo), emprego (com todos trabalhando), crescimento (com todos produzindo). Com isso tudo e boa dose de justo otimismo, teríamos as ferramentas para a virada. Não vale a pena tentar?
Não discuto visão macroeconômica. Muitos outros estudiosos no assunto poderão fazê-lo melhor do que eu, que sou apenas empresário e cidadão. Mas, do ponto de vista da produção, do potencial prático de crescimento que tem esse país, acredito ter uma colaboração a dar. Desde os cinco anos de idade sinto o cheiro da produção, do emprego, do chão da fábrica. Sempre nas crises (e foram tantas...) ouvi dizer que o Brasil ia melhorar e ser o país do futuro. Nunca a produção falhou. Cada vez mais, com inflação, com recessão, com deflação, com hiperinflação, lutamos, crescemos, sobrevivemos e cumprimos nosso papel.
Se temos condição de equilibrar este país com aumento de exportações, é só nos darem condições de que, mais uma vez, a produção responda positivamente, da maneira mais rápida e mais forte que se imagina.
Se temos que fazer um pacto pelo emprego/salário para crescer no mercado interno, é só nos darem condições que assim o faremos. Se em razão de um sacrifício maior pela estabilidade precisarmos considerar um dólar irreal de R$ 1,50 por mais um tempo, podemos fazê-lo.
Tenho conversado com empresários do Norte ao Sul do país, responsáveis por microempresas, pequenas empresas, grandes empresas. Em todos destaco uma atitude comum, inequívoca, de confiança no Brasil e, ao mesmo tempo, de perplexidade diante dos fatos econômicos do momento. Todos querem trabalhar e produzir. Para isso, já se disseminou pelo país afora um diálogo maduro entre as empresas e seus empregados, dando uma força nova à parceria das forças geradoras do progresso.
Essas lideranças da produção não precisam ser convocadas. Não precisam ser estimuladas a continuar assumindo riscos na caminhada rumo ao progresso. Na agricultura, no comércio, na mineração, no turismo, nos serviços, nas indústrias, os espaços estão abertos para uma nova arrancada, que, em alguns casos, já começou de forma tímida porque está faltando o posicionamento claro da administração pública.
O Estado, pela via dos impostos, é o grande sócio oculto das nossas empresas. Precisa, portanto, que elas avancem para que possam gerar os recursos necessários ao Tesouro. Mais ainda, os reais que o país precisa investir para resgatar nossa dívida social.
A verdade é que a produção está pronta, mais uma vez, para ser o instrumento maior, a ser usado pelo governo para embasar uma nova proposta de país. Estamos ao lado do governo para discutir, na prática, propostas de crescimento, investimento, emprego, aumento de exportações etc.
Nós somos uma parte desse governo e precisamos ficar juntos para lutar, lado a lado, por um país melhor, independente, aberto à economia mundial, aliado ao capital internacional, que se dedique a investimentos produtivos. Mas só podemos agir assim mantendo viva a chama de desenvolvimento, aproveitando todo nosso potencial de crescimento e transformando o sonho do futuro na realidade do presente que todos queremos. Estabilidade sim, mas com crescimento sustentado.


Benjamin Steinbruch, 45, empresário, graduado em administração de empresas e marketing financeiro pela Fundação Getúlio Vargas (SP), é presidente dos conselhos de administração da Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio Doce.
E-mail: bvictoria@psi.com.br



Texto Anterior: Governo tenta reabrir crédito
Próximo Texto: Camdessus defende política monetária "boa e sólida" no país
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.