São Paulo, domingo, 02 de abril de 2006

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DINHEIRO

Para secretário-geral-adjunto do órgão, país deve mirar-se na China e na Índia a fim de obter mão-de-obra mais qualificada

Educação é o maior desafio do Brasil, diz OCDE

CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Brasil terá que imitar a China e a Índia e incluir mais jovens no sistema educacional especializado, a fim de garantir mão-de-obra qualificada no futuro e não ficar para trás, segundo o secretário-geral-adjunto da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que reúne 30 países ricos), o alemão Herwig Scholögl.
O efeito anabolizante da desvalorização do dólar na posição do Brasil no ranking mundial das maiores economias do mundo -apesar de ter crescido apenas 2,3% no ano passado, o Brasil subiu da 15ª para a 11ª posição- não foi o suficiente para fazer o Brasil recuperar a 8ª posição, que já ocupou.
Para Scholögl, porém, a economia brasileira vai melhor agora, e isso não é uma contradição. "Isso ocorreu porque apareceram outros atores que ocuparam o lugar de outros países em termos relativos, como China e Índia, não porque o Brasil piorou", disse.
Para ele, os países deveriam concluir a Rodada Doha de liberalização comercial antes de fazer acordos bilaterais de comércio, já que esses arranjos, como a até agora fracassada tentativa de acordo comercial entre o Mercosul e a União Européia, não incluem o comércio mais importante, como os produtos agrícolas. "O Mercosul também não se desenvolveu como se esperava."
Segundo ele, apesar da grande liquidez mundial, muitos países em desenvolvimento não estão conseguindo fazer as linhas de crédito chegarem aos pequenos empreendedores, que são os atores que impulsionam a economia, e, para consertar isso, os governos precisam melhorar as instituições e fortalecer o microcrédito.
Leia entrevista concedida à Folha na sexta-feira, ao participar da Conferência Global da OCDE para o Financiamento das Pequenas e Médias Empresas, em Brasília.

Folha - Apesar de ter subido da 15ª para 11ª posição no ranking das maiores economias, o Brasil perdeu posição nos últimos anos. O país está ficando para trás?
Herwig Scholögl -
O Brasil está indo melhor do que antes, e isso não é contraditório. O Brasil perdeu posição porque surgiram outras economias de peso no mercado, como China e Índia, e outras das chamadas novas economias IT (Tecnologia da Informação), que tomaram o lugar que outros países ocupavam em termos relativos. Mas o Brasil desenvolveu muito sua economia nos últimos anos e está bem localizado na economia mundial.
O país é muito forte em recursos naturais e tem um grande parque industrial, e uma das razões para estar bem colocado na economia mundial é justamente por causa da demanda do mundo por esses recursos. Mas o principal desafio para o Brasil, se formos comparar com a China e com a Índia, é educação. É necessário melhorar o sistema de educação para incluir mais crianças e jovens. Assim o país terá um número maior de mão-de-obra qualificada no futuro. Não só China e Índia mas outras economias em desenvolvimento estão dando uma alta prioridade para a educação e o desenvolvimento de novas tecnologias.

Folha - Se o Brasil vai tão bem, por que não faz parte da OCDE?
Scholögl -
Para nós, é importante incluir atores importantes, como o Brasil, que têm um caráter global. Mas a associação do Brasil não está na agenda do governo brasileiro, portanto não pode estar na nossa. Para integrar a OCDE, é preciso ser uma economia de mercado avançada, ter atingido princípios democráticos, além de assinar certos acordos básicos, como a liberalização do mercado de capitais, por exemplo, e é preciso avaliar a estrutura legal do país. Mas nós ainda não examinamos o Brasil. Isso seria também uma decisão política, e os países-membros teriam que decidir sobre isso.

Folha - O atual governo brasileiro tem recebido críticas por reforçar a chamada diplomacia Sul-Sul, que prioriza o relacionamento com países latino-americanos e africanos, e por reduzir esforços para concluir acordos comerciais com EUA e UE. Qual a sua opinião?
Scholögl -
Esse tipo de diplomacia não é exclusiva. Os países da OCDE têm que perceber que os chamados países em desenvolvimento, como o Brasil, estão aumentando a cooperação com seus pares no mundo em desenvolvimento, e um exemplo disso é que o Brasil está aumentando sua cooperação política e econômica com a China, o que é bom porque ajuda a todos nós a integrar a China no sistema global. Os países da OCDE têm que perceber que a diplomacia não é mais algo dirigido apenas por eles, e cada vez mais vai ser dirigida por países em desenvolvimento.

Folha - Os acordos comerciais com os países em desenvolvimento não evoluem porque a Europa e os Estados Unidos querem esperar os resultados da Rodada Doha, de liberalização do comércio mundial.
Scholögl -
Nós fizemos um estudo na OCDE sobre acordos regionais e acordos multilaterais de comércio e o resultado foi que os acordos regionais podem, até um certo ponto, ajudar na liberalização em escala global, mas o crescente número de acordos bilaterais e plurilaterais também arrisca prejudicar o sistema multilateral de comércio. Os governos têm que perceber que esses acordos não solucionam as questões fundamentais de Doha, como a agricultura, por exemplo.
Se os EUA fizerem um acordo com a Austrália, os problemas de acesso agrícola vão ficar de fora. Para isso, é preciso o sistema de trade-off (trocas) das negociações multilaterais. Por isso, estamos cada vez mais céticos a respeito do aumento de acordos regionais de comércio e acordos bilaterais. Parece-me correto esperar. Talvez eles tenham outras razões também. O Mercosul tem que definir sua identidade de uma forma mais clara, o bloco não se desenvolveu da forma que se esperava.

Folha - O sr. elogiou os indicadores macroeconômicos do Brasil. O país já está maduro para reduzir os juros mais altos do mundo?
Scholögl -
Não faço comentários sobre as políticas monetárias dos bancos centrais, porque sei que eles sabem melhor do que os analistas de fora o que devem fazer. Mas o importante é que eles atuem independentemente da política. Se a política pressionar o Banco Central ou prescrever políticas, o papel do Banco Central fica prejudicado.


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