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São Paulo, sexta-feira, 02 de maio de 2003

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LUÍS NASSIF

BC em mãos amadoras

Se o presidente do Fed (o Banco Central norte-americano) tivesse declarado que seu único objetivo era combater a inflação, teria sido demitido. Quem chama a atenção para isso é o economista Michal Gartenkraut.
No entanto, foi essa a afirmação do presidente do Banco Central brasileiro, Henrique Meirelles, demonstrando a mesma visão tecnocrática, monofásica, limitada dos seus antecessores que destruíram parte da economia brasileira no período de valorização cambial e juros pornográficos do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso. Fez mais: irresponsavelmente sinalizou para maior queda do dólar, mesmo sabendo que o movimento atual é puramente psicológico e caracteriza um "overshooting".
O papel de um presidente de BC competente é o de combater a inflação com o mínimo de sacrifício para o país. É também atuar com competência, prevendo os desdobramentos futuros de medidas, e não ceder ao deslumbramento basbaque com resultados imediatos da política monetária.
A curva de juros é decrescente, não há ingresso forte de capitais no país. Tudo sinaliza para movimentos especulativos de curtíssimo prazo, de especuladores se beneficiando do diferencial de juros. Haveria espaço imediato para a queda de juros, se não mais aguda, pelo menos sinalizadora para frear o movimento especulativo do câmbio.
O presente caiu no colo de Meirelles e do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. O custo do real desvalorizado já havia sido pago, com os preços absorvendo os aumentos e a inflação começando a ceder. A desvalorização provocou forte impulso nas exportações, permitindo reduzir substancialmente a vulnerabilidade externa. Tudo isso somado a uma redução substancial dos compromissos externos deste ano -em parte devido à liquidação antecipada de financiamentos externos no ano passado criou um céu de brigadeiro para a política econômica.
Em mãos profissionais, poderia abrir espaço para sair da armadilha cambial e de juros do Real. Em mãos dogmáticas, é o pré-ensaio de uma tragédia anunciada.
Meirelles está conseguindo o pior dos mundos, juntar a apreciação cambial do período Gustavo Franco com a volatilidade cambial do período Armínio Fraga no ano passado.
O forte superávit registrado nesse período reflete exportações contratadas e, ao tempo em que o dólar superou largamente os R$ 3,00. Se o câmbio continuar despencando nessa velocidade, será rápida a reversão dos superávits comerciais. Ao menor sinal de que se inverteu a mão na balança comercial, esse capital especulativo sairá do país voltando a apreciar agudamente o dólar. Mas com uma diferença: o exército de pequenos exportadores que acordou para o mercado externo no ano passado, em razão do câmbio favorável, não irá ousar repetir a experiência.
É bom Lula acordar enquanto é tempo.

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