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MARCOS CINTRA
Se eu fosse deputado...
É preciso "desprofissionalizar"
a política e desmantelar as organizações criminosas incrustadas no governo
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ESTOU escrevendo este artigo
na sexta-feira. Antes, portanto, de conhecer o resultado
das eleições de ontem. Mas o que desejo transmitir serve para todo brasileiro que tenha a responsabilidade
de conduzir este país, seja ele Lula,
Alckmin ou qualquer outro cidadão.
E fiz questão de não publicá-lo antes
das eleições para refutar insinuações de que pudesse se tratar de uma
peça de propaganda a favor ou contra qualquer candidato.
É deprimente constatar que criminosos permanecem na vida pública e as instituições que deveriam
puni-los pouco atuam nesse sentido. Estão vivos na mente do cidadão
honesto casos de corrupção como o
dos anões do Orçamento federal,
dos gafanhotos de Roraima, a compra de votos no Congresso, os vampiros, o valerioduto, os Waldomiros,
o esquema dos sanguessugas e, agora, o dossiêgate.
Recentemente, no caso do mensalão, o TSE pouco fez em relação à
confissão de crimes eleitorais praticados por deputados e pelos partidos políticos. Os interesses dos "profissionais da política" prevaleceram
e a maioria dos parlamentares envolvidos no escândalo se manteve
na vida pública. O jornal britânico
"Financial Times", por exemplo, publicou matéria no ano passado afirmando que "acusações de fraudes e
apropriação de verbas públicas não
incomodam os ricos e poderosos no
Brasil, uma vez que esse é um fato do
cotidiano e as chances de [alguém]
ser punido são próximas de zero".
Segundo a ONG Transparência
Brasil, desde 2003 ocorreram mais
de 1.020 casos de corrupção no país
nos três níveis de governo. Isso equivale a cerca de um novo caso a cada
dia, sendo que o partido campeão
das maracutaias, segundo ainda a
entidade, é o PT.
A reforma político-eleitoral é uma
demanda fundamental para moralizar a administração pública brasileira. É preciso "desprofissionalizar" a
política e desmantelar as organizações criminosas incrustadas no governo. O exercício de funções eletivas deve ser uma contribuição do cidadão à coletividade. Uma pessoa
que passe a depender da vida pública para sua manutenção torna-se capaz de tudo e de qualquer coisa para
sobreviver. Ele fará da política um
"grande balcão de negócios".
A política precisa de um tratamento de choque no Brasil. Nesse
sentido, avanço algumas medidas
que, se implantadas urgentemente,
poderão estancar o caudaloso fluxo
de corrupção e desmandos na vida
pública do país. Se eu fosse deputado, seriam medidas que transformaria rapidamente em projetos de lei:
1) financiamento exclusivamente
público de campanhas eleitorais, para controlar o poder econômico e
desestimular negociatas com financiadores privados de campanhas;
2) voto distrital (preferencialmente misto) para aproximar o eleitor do eleito e proporcionar mecanismos mais eficientes de mútuo conhecimento e fiscalização;
3) radical redução dos cargos em
comissão de livre provimento na administração pública para fortalecer
a formação de uma burocracia administrativa profissional e estável;
4) eliminação da remuneração para o exercício de cargos eletivos no
Legislativo (vereadores, deputados
e senadores), aceitando-se somente
o reembolso de custos incorridos no
exercício da função, para evitar a
profissionalização da política;
5) proibição de reeleições sucessivas também para o Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) para estimular a rotatividade e
evitar a acomodação dentro da atividade pública eletiva;
6) impedimento ao exercício de
funções executivas por detentores
de mandatos legislativos para garantir a plena independência entre os
poderes;
7) obrigatoriedade de abertura automática dos sigilos fiscal e bancário
de todos os candidatos a cargos políticos e de administradores públicos,
independentemente de autorização
judicial, para coibir a corrupção e
inibir o apetite dos que entram na
política por motivos inconfessáveis
ou com passados duvidosos;
8) fidelidade partidária, para evitar que os parlamentares venais sejam cooptados em troca de apoio.
A atual crise é oportunidade histórica para o país empreender mudanças em sua estrutura política, visando fortalecer o sistema democrático
e eliminar práticas esclerosadas e
ilícitas que dilapidam a ética e as finanças públicas.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE , 60,
doutor pela Universidade Harvard (EUA), professor titular
e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas, foi deputado federal (1999-2003). É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a
cada 15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
mcintra@marcoscintra.org
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