São Paulo, Quarta-feira, 03 de Março de 1999
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LUÍS NASSIF

A marcha da insensatez

O Congresso está na obrigação constitucional de convocar o ministro da Fazenda, Pedro Malan, e exigir dele explicações sobre o que está acontecendo. Nenhum governante, nem mesmo presidentes constitucionalmente eleitos, têm o direito de expor o país ao caos dessa maneira.
O que está em jogo, nessa queda-de-braço do câmbio, é a segurança nacional. E o país está sem governo. Os recados vêm de todos os lados para FHC, mas em vão. Elegante, mas duro, o senador Antonio Carlos Magalhães deu duas entrevistas a jornais cariocas, neste final de semana, com recados incisivos sobre interferências do FMI.
Estava claro que o recado era para o próprio FHC, exortando-o a romper com a letargia e a começar a atacar decididamente a especulação cambial. Por que não deu o recado pessoalmente? Porque aparentemente FHC colocou-se à margem de qualquer conselho.
O próprio PT recuou de sua posição mais radical e cerrou fileiras em torno da governabilidade.
No mundo real, importadores estão querendo a todo custo evitar consolidar a nova cotação do dólar. Sindicalistas dão declarações contra a volta da indexação, o comércio procura rebater altas de preços, consumidores trocam de marcas. Em outras circunstâncias, o país teria tudo para começar a vencer a crise. O câmbio abre possibilidades de retomada de crescimento, de redução de juros, permitindo atacar as duas grandes fragilidades, nas contas externa e interna.
O mero resultado positivo da reunião com os governadores, na última sexta-feira, motivou os primeiros elogios que FHC recebe da imprensa internacional, em muitos meses. Governadores oposicionistas saíram elogiando o governo, alguns percebendo que se poderia desenhar um novo país. Até o duro Olívio Dutra dispôs-se a negociar. Terminada a reunião, nada foi feito, nada pensado, nada constituído. Governadores oposicionistas, partidos oposicionistas, empresários, trabalhadores, todos dando trégua ao governo, querendo a todo custo preservar a governabilidade, e o governo não age.
A posição de FHC foi a de que estava sendo vítima de uma confluência de episódios negativos, mas que tudo tinha terminado na sexta-feira. A partir de segunda-feira seria um novo mundo. O que se vê são os fatos positivos se esvaindo, as oportunidades políticas sendo desperdiçadas pela falta de qualquer tipo de ação.
Na tarde da sexta-feira negra que se seguiu à mudança da banda cambial, o ministro Malan deu entrevistas à imprensa dizendo que o Banco Central voltaria a ser operacional. Agora o dólar bate em níveis assustadores, ameaçando levar o pânico aos consumidores, e nada é feito. O governo assiste inerte à volta da especulação cambial, a volta da inflação, em um momento em que a bola está com ele.
Não se sabe onde está Malan. Quem está procurando bancos estrangeiros, solicitando reabertura de linhas comerciais, ou seu apoio para a reversão da imagem do país lá fora, é o segundo escalão do Ministério da Produção.
É o momento de o Congresso declarar estado de emergência e assumir suas funções constitucionais. O país precisa saber o que está acontecendo.

E-mail: lnassif@uol.com.br


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