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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Um primeiro passo
A mudança nas cotas do FMI foi um 1º passo para resolver
os problemas de legitimidade
e representatividade
VOU ESCREVER hoje sobre um
tema que não costuma provocar no leitor o que Nelson Rodrigues chamava de "arrancos
triunfais de cachorro atropelado".
Trata-se do FMI. Compreendo o escasso entusiasmo. Mas é que a diretoria do Fundo tomou uma decisão
que convém explicar um pouco: a reforma das cotas e dos votos.
Das 24 cadeiras da diretoria, 19 votaram a favor (EUA, Japão, Canadá,
Austrália, as oito cadeiras européias,
China, Índia, Brasil, Indonésia, Venezuela e as duas cadeiras africanas). Como revelou o diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn, três cadeiras votaram contra
(Rússia, Arábia Saudita e Irã) e duas
se abstiveram (Argentina e Arábia
Saudita). As cadeiras que votaram
favoravelmente detêm 86,6% dos
votos ponderados.
A decisão definitiva cabe aos governadores dos 185 países-membros (quase sempre os ministros da
Economia ou os presidentes de
BCs), que votarão país por país (e
não por cadeira, como na diretoria)
até o dia 28. Para que a reforma seja
aprovada, será preciso ter 85% dos
votos ponderados e 3/5 dos países.
O Brasil é um dos países que mais
ganham com a proposta. A nossa cota efetiva aumenta 40% em termos
nominais, ao passar de 1,4% para
1,8% do total. O nosso poder de voto,
de 1,4% para 1,7%.
Segundo o critério de pontos percentuais, o Brasil é o quarto maior
ganhador em poder de voto entre todos os países-membros. Como a
maioria dos países da nossa cadeira
teve ganhos, o poder de voto da diretoria do Brasil aumenta de 2,4% para 2,8%.
Em termos de posição relativa, o
Brasil passa de 18º para 15º entre os
185 países-membros. A nossa cadeira sobe de 21ª para 18ª entre as 24
cadeiras da diretoria no ranking de
poder de voto.
A nova fórmula para cálculo das
cotas traz algumas inovações. Uma
delas foi a maior relevância do PIB,
cujo peso sobe de cerca de 30% para
50%. Outra novidade foi a incorporação do PIB calculado segundo a
paridade do poder de compra (PPP)
como um dos componentes na determinação da variável PIB (com
participação de 40%).
O aumento da participação do
Brasil baseia-se em um critério adicional, que leva em conta a existência de países muito subrepresentados em termos de PIB-PPP. É o caso
do Brasil, que tem uma quota efetiva
de 1,4% do total, quando a sua participação no PIB-PPP mundial chega
a 2,9%. Estabeleceu-se que, nesses
casos, o aumento nominal mínimo
da cota ficará em 40%.
A transferência de votos dos países desenvolvidos para os em desenvolvimento será de 2,7 pontos percentuais. Os países emergentes e em
desenvolvimento contarão com
42,1% dos votos. Ao longo do tempo,
com a nova fórmula, a expectativa é
que os países em desenvolvimento
passem a ter maior participação nas
decisões do FMI.
A mudança poderia ser maior?
Teoricamente, sim. O problema é
que a reforma precisa de 85% dos
votos para ser aprovada. Qualquer
mudança abrupta, que implicasse
perdas maiores para alguns países
ou grupos de países, poderia ser bloqueada com relativa facilidade.
Daí a importância de entender essa mudança como um primeiro passo, que apenas começa a resolver os
problemas de legitimidade e representatividade do FMI. Por isso, a
nossa cadeira lutou até o último momento para reforçar o compromisso
com a revisão periódica das cotas. A
resolução submetida à consideração
dos governadores estabelece que
haverá a revisão a cada cinco anos,
de forma a alinhar as cotas e os votos
à evolução da economia mundial.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 53, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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