São Paulo, quarta-feira, 03 de maio de 2006

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TENSÃO ENTRE VIZINHOS

Presidente conversa com colega boliviano e, em nota, diz que o abastecimento ao Brasil está garantido

Lula vê ato "soberano" e descarta falta de gás

HUMBERTO MEDINA
PEDRO DIAS LEITE

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Palácio do Planalto afirmou ontem, por meio de nota, que o governo brasileiro reconhece o "ato inerente à soberania" da Bolívia de nacionalizar suas reservas de gás natural, mas disse garantir que o abastecimento do produto ao Brasil será mantido normalmente. O anúncio ocorreu após conversa por telefone entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o colega boliviano, Evo Morales.
Na nota, que pode ser vista como um apoio à decisão de Morales, o governo informou ainda que o preço do gás terá de ser negociado entre os dois países. Lula falou por telefone também com os presidentes Hugo Chávez (Venezuela) e Néstor Kirchner (Argentina). Foi agendado um encontro de emergência entre Lula, Morales e os dois, em Foz do Iguaçu, amanhã, para tratar do tema. O governo considera a reunião uma largada para as negociações.
No encontro de amanhã, deverá inclusive ser feito um convite para que a Bolívia passe a integrar o projeto do "Gasoduto do Sul", um supergasoduto orçado em mais de US$ 20 bilhões, que ligaria a Venezuela ao Uruguai e passaria por todo o território brasileiro.
As decisões foram tomadas durante reunião de mais de cinco horas de Lula com seu vice, oito ministros, o presidente da Petrobras e assessores para tratar da questão Bolívia. O governo, que antes estudava medidas mais duras, mudou de posição e decidiu evitar o confronto. Anteontem, o ministro Silas Rondeau (Minas e Energia) havia falado em "rompimento" e o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, em "reações fortes" do Brasil. Ontem, a ordem era negociar.
A nota, divulgada ontem à noite, diz que o abastecimento de gás estava garantido "pela vontade política de ambos os países, conforme reiterou o presidente Evo Morales em conversa telefônica com o presidente Lula" e por "dispositivos contratuais amparados no direito internacional".
Antes da conversa com Morales, Gabrielli já havia dito a Lula que a nacionalização anunciada anteontem não causará problemas no fornecimento de gás.
Pela manhã, Gabrielli disse à TV Globo: "Estamos intensificando ao máximo possível a produção brasileira e estudando alternativas para a expansão do fornecimento de outras fontes".

"Sem preocupação"
Em briefing à tarde, o porta-voz da Presidência da República, André Singer, já dizia que o fornecimento de gás "continuará de forma absolutamente normal, e que os consumidores e as empresas não têm com o que se preocupar".
O decreto assinado por Morales anteontem determina que toda a produção seja vendida para a estatal boliviana do setor (YPFB), aumenta o imposto sobre o gás de 50% para 82% e impõe prazo de 180 dias para que as empresas estrangeiras que operam na Bolívia decidam se aceitam as novas regras ou deixem o país.
À noite, o assessor especial da Presidência da República para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, que participou da reunião com Lula, admitiu que o governo brasileiro "gostaria que as coisas não tivessem sido dessa forma [com a Bolívia]". "Mas aconteceram, e política não se faz com o fígado". Na telefonema a Morales, Lula deixou claro que gostaria de ter sido informado. Mas, por enquanto, o governo ainda "confia no diálogo".


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