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TENSÃO ENTRE VIZINHOS
Falta de investimentos em hidrelétricas muda matriz energética no país e aumenta dependência por gás
Gás terá impacto sobre preço da energia
FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL
O desfecho da crise do gás boliviano certamente provocará um
aumento dos preços da energia
no Brasil nos próximos anos, seja
ela industrial ou residencial.
A partir de 2007, o Brasil ingressará em um quadro de dependência cada vez maior do gás em sua
matriz energética, resultado de
uma paralisia geral dos investimentos em energia hidrelétrica.
Das 23 concessões autorizadas
entre 2000 e 2001 para a construção de novas hidrelétricas, nenhuma saiu do papel. As concessionárias afirmam que a remuneração fixada pelo governo Lula (o
preço da energia) não é atrativa e
abandonaram os investimentos.
Sem essas obras, o país dependerá cada vez mais de usinas termoelétricas, que precisam principalmente de gás para operar. No
último leilão de "energia nova"
promovido pelo governo, por
exemplo, 70% do pregão foi dominado pelas fontes térmicas.
Dos 30% restantes, de energia
hidrelétrica, dois terços foram assumidos basicamente por estatais, as únicas que aceitaram os
preços fixados pelo governo.
Na iniciativa privada, há casos
emblemáticos como o de quatro
usinas (São Salvador/TO, Salto
Pilão e Foz do Chapecó/SC e Serra
do Facão/GO) com todas as licenças autorizadas e que também
não andam por causa do preço.
Nesses leilões públicos, o governo fixa um valor máximo para a
energia. Se as empresas acharem
que o preço não pagará o investimento (o que tem acontecido)
elas simplesmente adiam ou desistem dos investimentos.
Hoje, o Brasil paga US$ 3,13 o
milhar de metros cúbicos pelo gás
da Bolívia, seu maior fornecedor.
Até a oposição ao presidente boliviano Evo Morales quer um preço
de, no mínimo, US$ 5 para o produto, ou seja, 60% maior.
Especialistas ouvidos pela Folha
consideram "otimistas demais",
ou até "equivocadas", as premissas da EPE (Empresa de Planejamento Energético) para a oferta
de energia no Brasil contidas no
Plano Decenal (2006 a 2015) do
governo, apresentado este ano.
Elaborado com base em modelos matemáticos com várias premissas que podem ou não se concretizar, o governo apresentou
nesse plano uma expectativa de
quanto o país produzirá e consumirá de energia no período.
No plano, o governo considera,
por exemplo, que estarão em funcionamento daqui a 3,5 anos usinas no rio Madeira, em plena selva amazônica, que não têm no local sequer um canteiro de obras.
Outra premissa era de que a Petrobras aumentaria seus investimentos na Bolívia, o que não deve
ocorrer com a nacionalização.
"Já estamos entrando no gás.
Com certeza, o preço médio da
energia no país vai ficar mais caro", diz Paulo Pedrosa, presidente
da Abraceel (Associação Brasileira dos Comercializadores de
Energia Elétrica).
"Entrar no gás" significa que a
participação de 16% do produto
na matriz energética aumentará
rapidamente na ausência de novas hidrelétricas (ver quadro).
Segundo Luiz Fernando Vianna, presidente da Apine (Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica),
o Plano Decenal do governo também contava com um "céu de brigadeiro" na questão do preço do
gás. "Como vimos, essa premissa
também estava errada", diz.
Para José de Freitas Mascarenhas, diretor da área de infra-estrutura da CNI (Confederação
Nacional da Indústria), "a sorte"
do Brasil no momento é que o clima tem ajudado, e a maioria das
barragens no país está cheia.
Mesmo isso não deve impedir,
porém, um avanço do gás na matriz energética a médio prazo.
Para Vianna, da Apine, o governo procurará acelerar a prospecção de gás na Bacia de Santos,
com previsão de 6 milhões de metros cúbicos/dia a partir de 2008.
Mas, mesmo que chegue aos otimistas 25 milhões de metros cúbicos/dia em 2010, Santos estará
produzindo pouco mais da metade da capacidade da Bolívia hoje.
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