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São Paulo, quinta-feira, 03 de julho de 2003

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ARTIGO

Boom nos emergentes pode acabar em lágrimas

JOHN PLENDER
DO "FINANCIAL TIMES"

Depois de atingir seu nível mais baixo em uma década, o fluxo líquido de capital privado para os mercados emergentes deve subir de US$ 110 bilhões em 2002 para US$ 139 bilhões neste ano, de acordo com projeções do Instituto de Finanças Internacionais, uma associação de bancos internacionais. O boom nos títulos de mercados emergentes responderá por boa parte do ímpeto constatado nessa alta, refletindo a resposta daqueles que buscam captação à procura de rendimento pelos investidores.
Após crescer 28% do terceiro para o quarto trimestre de 2002, as emissões líquidas dos países em desenvolvimento subiram 13%, para US$ 13,2 bilhões, no primeiro trimestre de 2003, segundo o BIS (Banco de Compensações Internacionais). Os maiores emissores estão na Ásia. A agência de classificação de crédito Moody's estimou em junho que as emissões asiáticas de títulos respondem por 57% do total de bônus de mercados emergentes, US$ 3,5 trilhões. A seguir vem a América Latina (24%).
O fluxo de capitais para a Ásia, ainda assim, se apequena diante das exportações regionais de capitais, mais especialmente aos EUA, para financiar o déficit do país em conta corrente. Determinar se esse padrão de movimento de capital, dos países relativamente pobres para a economia mais rica do mundo, faz sentido é uma questão confrontada pela mais recente revisão trimestral do BIS.
À primeira vista, adquirir ativos financeiros em economias maduras que oferecem rendimentos inferiores aos de investimentos alternativos em casa é um uso dispendioso e perdulário de recursos reais. É igualmente paradoxal que as reservas cambiais oficiais asiáticas tenham feito mais para ajudar a desenvolver o mercado de títulos de agências semi-oficiais norte-americanas do que para estimular o crescimento dos mercados internos de títulos em seus países.
No entanto Robert McCawley, do BIS, aponta que o custo do acúmulo de reservas cambiais de baixo rendimento precisa ser avaliado em comparação com a melhoria percebida na posição de crédito de um país. Se as reservas cambiais reduzem a probabilidade de uma crise que poderia custar 5% do PIB (Produto Interno Bruto), seu custo operacional talvez seja justificado. Ele acrescenta que não se pode presumir que um acúmulo menor de reservas cambiais resultaria em mais investimento doméstico. Além disso, o grau de integração dos mercados de bônus do leste asiático talvez esteja sendo subestimado. Quase metade dos títulos internacionais emitidos por instituições da região terminam nas mãos de investidores da mesma região.
Na verdade, o leste asiático vem exportando capital relativamente seguro -investindo em papéis de alta qualidade norte-americanos, europeus e japonês- enquanto importa capital de risco de investidores nos países desenvolvidos. Ao usar os mercados mundiais para realizar essa troca internacional de riscos, a região reforçou os seus balanços nacionais e empresariais, enquanto punha fim à crise asiática dos anos 90 por meio das exportações. De sua parte, os EUA vêm servindo como banco ao financiar ativos arriscados do leste asiático em troca de passivos mais seguros.
Mas isso não pode ser sustentado indefinidamente, porque a base de capital dos EUA vem enfraquecendo. A dívida internacional líquida circulante do país chegou a US$ 2 trilhões. Nos últimos anos, o retorno sobre ativos externos dos EUA excedeu o custo de seus passivos externos. Mas isso deixou de ser verdade em 2002, quando o serviço da dívida se tornou um dreno de capital.
Outra questão é se o acesso renovado dos países em desenvolvimento a uma fonte relativamente volátil de capital, os bônus, poderia terminar em lágrimas, como aconteceu durante a crise asiática. Na hierarquia dos instrumentos financeiros estáveis, o investimento estrangeiro direto vem em primeiro lugar, seguido por carteiras de ações. Em seguida vêm os bônus, mais instáveis, e os empréstimos bancários, ainda menos estáveis, fecham a lista.
Os bônus dos mercados emergentes são notoriamente inclinados a mudanças maníacas nas percepções dos investidores que geram ciclos de expansão e compressão. E é notável que o Brasil, responsável por dois terços da alta nos influxos líquidos dos mercados emergentes no primeiro trimestre deste ano, estivesse tomando empréstimos principalmente com prazos mais curtos, o que deixa um país vulnerável ao corte de créditos. Será que estamos encarando mais um caso de "lá vamos nós de novo"?


Tradução de Paulo Migliacci


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