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LUÍS NASSIF
O visionário Friedrich List
Na história do pensamento econômico brasileiro, há poucas referências ao
economista alemão Georg Friedrich List (1789-1846). Antonio
Barros de Castro, que já leu de
tudo, não se recorda de nenhuma influência maior de List nos
economistas brasileiros. Celso
Furtado o cita de passagem em
um de seus livros de memória,
mencionando sua visão sistêmica de desenvolvimento.
Sua obra máxima, "Sistema
Nacional de Economia Política", tem uma edição de 1983 da
coleção "Os Economistas", da
Editora Abril, com um prefácio
muito bom do ex-ministro Cristovam Buarque.
Depois de ter batalhado pela
unificação dos Estados alemães, List se exilou nos Estados
Unidos e assistiu, ao vivo e em
cores, à comprovação de suas
teses. Em 30 de julho de 1827,
participou ativamente da Convenção Nacional dos Protecionistas de Harrisburg, que faziam a defesa da produção manufatureira americana contra
a importação indiscriminada.
Em 1792, o então secretário do
Tesouro norte-americano, Hamilton, apresentou o "Report of
Manufactures", o primeiro projeto de defesa das manufaturas
norte-americanas, em reação
ao protecionismo que havia na
Europa. As tarifas iniciais foram insuficientes. Mas em 1808,
com a guerra explodindo, o comércio com a Europa foi interrompido. Em um ano, o número de indústrias têxteis saltou
de 8.000 para 31 mil. Quando o
livre comércio foi retomado,
veio de novo a crise.
Eram essas evidências que
List ia buscar para desenvolver
os princípios de sua economia
política. List se insurgia contra
os princípios da teoria das vantagens comparativas -segundo as quais cada país deveria se
concentrar em sua vocação natural. Previa que seus netos viriam os EUA se transformarem
na maior nação do mundo, justamente por não ter seguido esses princípios. Lembrava que
Adam Smith havia previsto que
a vocação dos EUA era eminentemente agrícola, como a da
Polônia.
O "insight" de List foi que o livre comércio entre duas nações
civilizadas só poderia ser mutuamente benéfico se ambas estivessem em um mesmo grau de
desenvolvimento industrial. Ao
contrário, qualquer nação que
estivesse atrasada em relação à
outra deveria, antes, aparelhar-se para entrar na livre concorrência com nações mais desenvolvidas.
É clássica sua análise do Tratado de Methuen (em 1703), da
Inglaterra com Portugal, que
ajudou a financiar a revolução
industrial inglesa. Demonstra
que, à época, os ingleses haviam
constatado que a melhor forma
de se desenvolver era exportar
produtos manufaturados e importar matérias-primas. Com o
acordo com Portugal, abre algumas vantagens para os vinhos portugueses. Em contrapartida, acumula saldos comerciais volumosos, que lhes permite levar todo o ouro e a prata
de Portugal, ir até a Índia, adquirir manufaturas do país. Depois, revende-las para toda a
Europa (mas não no seu mercado interno) e comprar matérias-primas.
Essa posição da Inglaterra foi
insensata?, indagava List. De
acordo com os princípios de
Adam Smith e da Teoria dos
Valores de J.B.Say, sim. Na prática, transformou-a na maior
potência do seu tempo, isso porque não estava interessada simplesmente em adquirir artigos
manufaturados de baixo custo
e perecíveis, mas adquirir a
"força de produção".
Não era um fanático pelo protecionismo. Diferenciava estratégias para cada estágio de desenvolvimento. Constatava que
o comércio era fundamental
para a modernização de um
país, mas que, se ele não tivesse
uma base interna forte, com
condições que poderiam, hoje
em dia, ser chamadas de competitividade sistêmica, o capital
e o comércio tenderiam a fugir
para centros mais adequados.
Daí a importância da segurança jurídica, da democracia, de
uma infra-estrutura adequada,
do controle das rotas comerciais, da visão geopolítica. E sua
crítica insistente aos cabeças de
planilha da época, prenhes de
citações eruditas, sem um pingo
de capacidade de analisar os fatos reais.
Talvez a diferença de destino
entre Coréia do Sul e o Brasil,
nos últimos 40 anos, esteja em
algum grande economista sul-coreano que leu List.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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