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NEGÓCIOS
Com vendas em baixa, empresas usam o caixa em aplicações financeiras, cuja receita por vezes ultrapassa o valor das vendas
Empresas imitam bancos para salvar lucro
ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL
Pesadelo de muitas, salvação de poucas. Se por um lado juros elevados e dólar em alta causaram estragos nos balanços da maior
parte das empresas no segundo
trimestre de 2002, por outro, ajudaram algumas companhias a
melhorar seus resultados e até a
evitar prejuízos.
Entre 205 empresas de capital
aberto que já publicaram balancetes referentes ao trimestre passado, 50 conseguiram ter resultado
financeiro positivo (receitas superiores às despesas).
Mas o que chama atenção mesmo é um grupo ainda menor de 19
empresas que teve resultado financeiro líquido maior que o operacional, segundo levantamento feito pela consultoria Economática a pedido da Folha.
Em outras palavras: essas companhias ganharam mais dinheiro
aplicando recursos do que produzindo. Um perfil mais apropriado
a bancos do que a empresas como Gradiente, Semp Toshiba, Bardella, Transmissão Paulista (Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista) e Bombril.
Conjuntura
Em alguns casos, essa "distorção", nas palavras dos analistas, é
provocada pela conjuntura.
Algumas empresas, por exemplo, dependem da importação de
insumos, cujos preços sobem em
tempos de dólar em alta. Isso prejudica o resultado operacional delas. Para se protegerem, fazem
aplicações em dólar e acabam tendo ganhos financeiros. Segundo a
economista Clarice Messer, diretora da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo),
isso aconteceu com algumas empresas do setor químico.
"O resultado operacional delas
piora, o que, em alguns casos, é
compensado pelo financeiro",
disse Clarice.
A Transmissão Paulista, de
acordo com analistas do setor elétrico, foi beneficiada pela conjuntura. A empresa tem muitos recursos em caixa e poucas dívidas.
Como não fez nenhum investimento produtivo importante nos
últimos tempos, partiu para aplicações financeiras. Juros e dólar
em alta garantiram à empresa, no
último trimestre, um resultado financeiro positivo de R$ 33,3 milhões contra uma receita operacional de R$ 5,4 milhões, segundo
dados da Economática.
"A Transmissão Paulista ainda
não deve ter encontrado bons
projetos nos quais investir e direcionou seu excesso de caixa para
aplicações financeiras", explica
Pedro Batista, analista de investimentos do Pactual.
A Bombril é outro exemplo de
empresa que teve resultado financeiro líquido 13 vezes maior que o
lucro operacional no último trimestre. Segundo Cláudia Musto,
diretora financeira da empresa, a
Bombril tem recursos a receber de
sua coligada no exterior em dólar
e em euro, cujos valores dispararam com a queda do real.
Questão de sobrevivência
Para um grupo empresas, no entanto, as aplicações financeiras têm representado um meio de sobrevivência nos últimos anos. Concorrência dos importados, juros altos e baixo crescimento econômico minaram a atividade produtiva de vários setores. Empresas têxteis, de construção civil e de eletroeletrônicos são exemplos.
Com as receitas operacionais em baixa, empresas optaram por aplicações financeiras. É uma forma de ganharem algum fôlego enquanto esperam a crise passar.
Há até casos em que são os resultados financeiros que têm salvado as empresas de prejuízos líquidos. Foi o que aconteceu, no
último trimestre, com Bardella,
Granoleo, Gradiente e Coinvest.
Segundo Cristina Müller, analista da RCW Consultoria, empresas como a Bardella viram suas encomendas minguarem e ficaram sem perspectiva.
"Algumas empresas se tornaram quase um banco. Com resultados operacionais cada vez piores, tiveram de desenvolver uma gestão financeira muito eficiente para continuarem funcionando", afirma a analista Cristina Müller, da RCW Consultoria.
A Gradiente também tem apresentado resultados operacionais muito baixos desde que vendeu sua participação na NG Industrial, fabricante de celulares, para a Nokia, há dois anos. Isso tem sido compensado pelas aplicações em dólar que fez com os recursos levantados com a transação. Mas, segundo analistas, se o caixa continuar no vermelho, o lucro líquido poderá virar prejuízo.
De acordo com Clarice Messer, diretora da Fiesp, com custos em alta e margens de lucro em queda, as empresas estão deixando de investir. "As empresas estão preferindo ter mais capital de giro. É uma postura defensiva, já que o acesso a crédito está muito ruim e as taxas de juros estão muito altas", diz Clarice.
As consequências para a já combalida atividade econômica brasileira são fatais. Menores investimentos produtivos contribuem para a queda da massa salarial e
para o aumento do desemprego. O nível de consumo cai ainda mais e as empresas acabam sendo ainda mais prejudicadas. Um preocupante círculo vicioso.
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