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BC aumenta a liquidez após dia de crédito "seco"
Grandes empresas não obtêm financiamento; juros a exportadores disparam
Para Octavio de Barros, do Bradesco, momento
é propício para autoridade monetária iniciar operação de desmonte de compulsórios
ROBERTO MACHADO
DA SUCURSAL DO RIO
GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA
O nervosismo de ontem no
mercado financeiro, explicitado na queda da Bovespa e na alta do dólar, teve reflexos diretos na economia não-financeira: o crédito ofertado pelas instituições financeiras para que
as empresas brasileiras possam
produzir ou vender a produção
-que já vinha minguando nos
últimos dias- chegou ao ponto
mais crítico desde o acirramento da crise global.
O setor mais afetado continua sendo o da exportação-
dependente de linhas de crédito em dólar-, mas mesmo as
grandes empresas com produção voltada para o mercado doméstico já têm dificuldades.
"A preocupação é com a falta
de liquidez. Os bancos brasileiros estão sólidos, mas a liquidez
é sempre um problema. Para a
exportação, o crédito secou
mesmo, mas o dia de hoje [ontem] mostra que nenhum setor
vai passar incólume pela restrição da oferta [de crédito], se
não forem adotadas medidas
adequadas", diz Erivelto Rodrigues, diretor da Austin Rating.
Ontem à noite, o BC anunciou mudança no recolhimento
compulsório com o objetivo de
resolver o problema de liquidez
no sistema financeiro, mas direcionada ao socorro de bancos
de pequeno e médio porte.
Segundo Rodrigues, empresas e instituições financeiras
expostas a crédito de longo prazo no mercado interno -como
o da venda de automóveis ou os
bancos que concedem crédito
consignado- tendem a ser as
mais afetadas no primeiro momento. "Quem tem empréstimo mais curto gira a carteira
mais rápido e resolve parte do
problema", explica.
José Augusto de Castro, vice-presidente da AEB (Associação
de Comércio Exterior do Brasil), diz que o crédito para exportadores "estancou totalmente" -e quem consegue obter financiamento aceita "condições inimagináveis", comparadas às de algumas semanas.
"Ninguém está conseguindo
acessar [linhas de crédito]. Os
poucos que conseguem têm
que pagar juros de 14%, 15%,
daí para cima. O tombo é maior
porque as condições mudaram
drasticamente. Há um mês, havia excesso de liquidez, e o exportador pagava taxas de 4% a
5% nos contratos de ACC
[adiantamento sobre contrato
de câmbio]", diz Castro.
Segundo estimativa da AEB,
o impacto da crise para as exportações será "residual" em
2008, mas pode ser "dramático" em 2009. "Pode estar se
formando um ciclo negativo. O
exportador não tem acesso a
crédito para produzir e sofre
também com a queda de preços
no mercado internacional."
Levantamento da AEB mostra que na terça-feira passada
(dia 30) as cotações das commodities exportadas pelo Brasil chegaram ao nível mais baixo do ano. Em relação à média
de preços praticados entre janeiro e setembro, as cotações
da soja em grão registravam
queda de 13,8%; café em grão,
26,5%, e milho, 17,4%.
"Isso mostra que crises sistêmicas exigem medidas sistêmicas. E não dá pra imaginar que
ficaríamos fora disso. O crédito
secou ou ficou muitíssimo mais
caro aqui dentro. Há uma aversão brutal a risco", diz o economista Álvaro Bandeira, diretor
da corretora Ágora.
Na avaliação de Paulo Rabello de Castro, da SR Rating, o
Brasil está começando a pagar a
fatura de "um surto" das autoridades monetárias dos países
ricos: "Evitaram um ataque
frontal às causas do desequilíbrio e injetaram liquidez na
economia internacional de
uma forma alucinada. Isso fez,
por exemplo, a Bovespa registrar a exuberância dos últimos
tempos. Agora, a Bolsa está devolvendo. É como os jogos infantis: estamos voltando 5 casas, depois de andar 30".
Compulsório
O economista Octavio de
Barros, diretor de pesquisas
econômicas do Bradesco, afirma que, diante do aperto de liquidez, é difícil identificar outro momento mais favorável do
que o atual para iniciar a operação desmonte dos compulsórios. Suas declarações foram
dadas antes das medidas anunciadas ontem à noite pelo BC.
Compulsórios são recursos
que os bancos são obrigados a
recolher ao Banco Central.
Segundo ele, o Brasil tem a
maior distorção no mundo em
relação aos compulsórios
-chegam a 53% sobre depósitos à vista, a 30% sobre a poupança e a 23% sobre depósitos a
prazo. "Não faz sentido importar uma crise de liquidez que é
totalmente externa tendo R$
259 bilhões de recursos aprisionados no Banco Central.".
"Se não for em um momento
como este, quando é que se poderá iniciar gradualmente a
operação de desmonte dessa
distorção?"
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